A adoção de plantio direto e em nível, rotação de culturas, terraceamento e outras podem minimizar os efeitos negativos das chuvas intensas e corroborarem para resolver o maior problema da região: as estiagens
As recentes inundações pelas chuvas no Rio Grande do Sul causaram um desastre sem precedentes. Muitas lavouras foram cobertas com lama e areia, rebanhos inteiros morreram afogados, galpões, maquinários e ferramentas foram totalmente destruídos com prejuízos de R$ 4,5 bilhões ao agronegócio gaúcho, afetando 200 mil propriedades rurais das 600 mil registradas. O maior prejuízo, entretanto, é que boa parte dos solos pode se tornar impróprio para plantio. Com a enxurrada, o solo foi completamente removido e a rocha ficou exposta.
PRÁTICAS SUSTENTÁVEIS – “O que aconteceu no Rio Grande do Sul é um ponto fora da curva, uma condição histórica única onde não tem manejo correto, perfil com alta infiltração ou terraço que segura. A enxurrada levou até áreas de vegetação nativa”, afirma o pesquisador da Embrapa Soja, Henrique Debiasi. Chuvas torrenciais, entretanto, com um grande volume de água em um curto espaço de tempo, que ocorrem no Paraná, também podem causar prejuízos consideráveis ao maior patrimônio do produtor rural: o solo. E a adoção de práticas sustentáveis como plantio direto e em nível, rotação de culturas, terraceamento e outras podem minimizar ou eliminar os efeitos negativos das chuvas intensas, orienta Debiasi, além de corroborarem para resolver o maior problema da região: as estiagens.
ESTIAGENS – “As perdas de água e solo por erosão, devido às chuvas, podem ser consideráveis, mas nosso risco maior são os problemas causados mais por falta de chuva do que o excesso dela. As quebras de safra normalmente são causadas pelas estiagens. A preocupação em melhorar a estrutura física, química e biológica do solo com descompactação, colocando diferentes raízes no sistema e melhorado a infiltração de água no solo, com cobertura verde, mantendo o solo coberto, plantio direto, calagem, gessagem, e outras práticas, fundamentais para evitar a erosão, também são básicas para manter a umidade do solo por mais tempo e fazer com que as plantas se desenvolvam melhor, com mais resistência a intempéries”, ressalta o gerente técnico da cooperativa, Rodrigo Sakurada
TERRAÇOS – Debiasi alerta que muitos produtores eliminaram total ou parcialmente os terraços ou não o conservam de acordo com a recomendação da pesquisa. “Ter um terraço mal feito ou mal conservado é pior do que não ter nenhum, porque a água acumula e quando estoura ou transborda, porque não tem estrutura adequada, a água desce com toda força e velocidade causando um estrago maior. Mesmo numa área de plantio direto bem feito, se não há terraços adequados, quando há chuvas de maior intensidade que a capacidade de infiltração, a água vai escoar e haver perda de solo, nutrientes e água. Mesmo se não houver estrago, a água que não infiltra vai fazer falta em alguém momento da safra”, enfatiza.
EM NÍVEL – Outro ponto fundamental, orienta Debiasi, é o cultivo em nível. “Observamos com frequência produtores que até fazem o plantio em nível, mas, para agilizar o serviço, fazem a pulverização no sentido de maior comprimento do terreno. Planta em nível, mas pulveriza morro abaixo e o efeito acaba sendo o mesmo, formando trilhos por onde a água escorre levando a um processo erosivo. Todas as operações têm que ser feitas em nível”, comenta.
PLANTIO DIRETO – Também,é preciso aumentar a taxa de infiltração de água no solo com adoção do plantio direto bem feito, sem movimentação do solo, com diversificação de culturas e cobertura permanente do solo. “Plantio direto envolve a integração dessas práticas, sem isso é qualquer outra coisa. Muitos dizem que fazem plantio direto, mas usam um meio termo e não atingem todo potencial do sistema. Não é só soja e milho, tem que diversificar e fazer cobertura, plantando milho com braquiária, braquiária solteira, aveia, milheto, tremoço, crotalária, nabo forrageiro, consórcio de plantas de serviço. É fundamental cobrir o solo para que a gota de chuva não atinja diretamente o solo, proteger das altas temperaturas, produzir raiz para eliminar a compactação e aumentar a infiltração de água, evitando que escorra. Este é um ponto fundamental”, afirma o pesquisador.
TRIGO – Para Debiasi, a rotação com milho e trigo já melhora significativamente o solo, a palha cobre melhor e o ciclo de cultivo diferenciado permite o plantio e colheita mais próximo do da soja, não deixando o solo descoberto por tanto tempo. “O trigo permite colher a soja tranquilamente e na janela de 70 dias entre as duas safras comerciais, e permite o plantio de uma cobertura – milheto ou nabo forrageiro – de ciclo mais curto, antes de entrar com o trigo”, diz. Experimentos realizados pela Embrapa mostram que na média de três safras o plantio de trigo em rotação com a soja resulta em média em seis sacas de soja por hectare a mais ou 14 sacas a mais por alqueire. “Isso cobre com folga o investimento feito com as lavouras de serviço e ainda protege seu principal patrimônio, o solo, evitando a erosão e sendo recurso contra a estiagem”, ressalta Debiasi.
CALAGEM – O pesquisador cita ainda a importância de se ter a condição química favorável para a raiz crescer. “Tem que atentar para o teor de alumínio tóxico e ter cálcio em profundidade. Pra isso é fundamental fazer a calagem com frequência, mesmo que em superfície, e levar o calcário em profundidade, aplicando gesso agrícola”.
NITROGÊNIO – A inoculação e coinoculação da soja com bactérias do gênero Bradyrhizobium e Azospirillum, além fixar nitrogênio, aumentam a produção de raízes em até 30%, em condições controladas, e a tolerância a estiagem. “É importante também escolher a cultivar correta em função da região e época de plantio, ajustando a população de planta e respeitar a época de semeadura indicada pelo zoneamento agrícola de risco climático. Em um futuro próximo devemos ter ainda uma variedade tolerante a estiagem”, orienta Debiasi. (Jornal Cocamar)