Café: Preços forçam torrefadores a adicionar grãos mais baratos às misturas

Tanto o café arábica de qualidade quanto o robusta mais barato tiveram grandes aumentos nos últimos meses.

Os preços globais do café atingiram níveis recordes à medida que condições climáticas adversas interromperam safras, elevando os custos para os consumidores e levando os torrefadores a adicionar grãos mais baratos às suas misturas.

Valores tanto do grão robusta, usado em café instantâneo, quanto da variedade arábica de maior qualidade, dispararam nos últimos meses.

Futuros do robusta em Londres, referência global, alcançaram um recorde de US$ 4.971 (cerca de R$ 27,2 mil) por tonelada nesta semana, enquanto os futuros do arábica negociados em Nova York subiram para US$ 2,49 (cerca de R$ 13,64) por libra-peso, próximo ao patamar mais alto em décadas.

“Os preços podem não ter atingido seu pico”, disse Steve Butler, cofundador da ChAI, uma empresa de previsão de preços de commodities que utiliza inteligência artificial. Ele acrescentou que o rali atraiu especuladores, que provavelmente continuarão aumentando suas apostas de que os preços seguirão subindo.

Uma recente onda de frio no Brasil, responsável por cerca de um terço da produção mundial de café —70% da qual é arábica—, despertou temores de escassez de oferta. O clima gelado no Brasil segue meses de seca no Vietnã, maior produtor mundial de robusta, levando a oferta global dos grãos ao seu quarto ano consecutivo de escassez.

Custos crescentes de transporte também pressionam o mercado. Ataques de militantes houthis no Mar Vermelho desde novembro forçaram navios que viajam entre Ásia e Europa a tomar a rota mais longa ao redor do Cabo da Boa Esperança, em vez de passar pelo Canal de Suez.

Os torrefadores sentem o aperto. Anna Manz, diretora financeira da Nestlé, disse a investidores em julho que “os custos de insumos tanto do café quanto do cacau” pressionariam as margens de lucro da gigante de alimentos pelos próximos seis meses.

Esses custos também estão sendo repassados aos consumidores. Na Itália, frequentadores de cafés não podem mais desfrutar de seu espresso matinal por um euro (R$ 6,15). O preço médio nas cidades do país subiu 15% desde 2021, chegando a 1,20 euro (R$ 7,38) neste ano, segundo o grupo de consumidores Assoutenti.

Os consumidores também podem notar uma mudança no sabor. Quando os preços do arábica estavam altos, de meados de 2021 até o início de 2023, e a oferta de robusta era abundante, os torrefadores começaram a adicionar mais grãos baratos às suas misturas, disse Charles Hart, analista sênior de commodities da BMI.

“O que, por sua vez, viu os estoques no Vietnã e no Brasil serem reduzidos e, assim, preparou o terreno para o aumento nos preços do café em 2024.”

Agora, diante de custos crescentes para ambas as variedades de grãos, os torrefadores estão tentando proteger suas margens de lucro cada vez menores, obtendo arábica de produtores mais baratos, principalmente do Brasil, e adicionando mais variedades de grãos de menor custo às suas misturas.

“Normalmente, a diferença entre Nova York [arábica] e Londres [robusta] é pequena apenas quando os preços estão baixos”, disse Judy Ganes, veterana analista de café. “Agora, com os preços altos, os torrefadores estão incorporando mais grãos de menor qualidade, principalmente do Brasil.”

Apesar da pressão ascendente sobre os preços, o mercado de café ainda “não é tão selvagem quanto o mercado de cacau no início deste ano”, disse Butler.

Os preços do principal ingrediente usado para fazer chocolate dispararam, levando a oscilações extremas do mercado à medida que fundos de hedge e outros especuladores corriam para sair de apostas perdedoras.

Embora o café não tenha visto volatilidade semelhante até agora, os preços altos levarão a uma “batalha” entre traders, que assumiram posições vendidas no final de junho ou início de julho, quando o mercado caiu, e aqueles que apostaram que os preços continuarão subindo, acrescentou Butler (Financial Times)

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