Lista de classificação de risco da UE criará desvio de comércio ao favorecer países em detrimento de outros.
A Comissão Europeia publicou nesta quinta-feira (22/5) a primeira lista que classifica os países de acordo com risco de desmatamento, para controlar a entrada de sete commodities a partir do fim do ano no mercado europeu e que terá impacto no comércio agrícola.
O Brasil foi classificado como de “risco padrão” (médio) com outros 49 países. A classificação representou um óbvio alívio ao Brasil, por não ter sido etiquetado como de ‘risco alto’, até porque o sentimento entre importantes observadores sempre foi de que a lei antidesmate e a escolha dos produtos tinham como grande alvo justamente o Brasil.
De toda maneira, a lei antidesmate e a classificação de risco deixarão o Brasil sobre pressão permanente dos europeus. Não será surpresa se Bruxelas usar essa lei para questionar expansão de produção em determinadas áreas, alegando com a revisão de sua classificação de risco, por exemplo.
Além disso, o “benchmarking” adotado pela UE não deixa de arranhar a reputação do país. E a classificação de risco-país pela Europa, na prática, criará desvio de comércio ao favorecer países em detrimento de outros – favorecendo os EUA, por exemplo.
Questionamentos dos países
O Brasil e outros países produtores sempre questionaram a lei antidesmatamento por entenderem que a União Europeia não deveria ter direito de impor esse tipo de instrumento. Tampouco entendem como Bruxelas chegou precisamente à conclusão do risco por país.
O embaixador brasileiro junto à UE, Pedro Miguel da Costa e Silva, afirmou à coluna: “Nós nunca consideramos a lei antidesmatamento um instrumento adequado para lidar com o problema que os europeus dizem querer ajudar a resolver. O sistema de classificação de países é um detalhe especialmente nocivo e discriminatório da legislação. Basta observar que os países europeus votaram em sua própria classificação na lista, e decidiram que são ‘baixo risco'”.
Classificações globais
Somente quatro países foram colocados na categoria de risco elevado: Rússia, Bielorússia, Myanmar e Coreia do Norte – já sujeitos a sanções do Conselho de Segurança da ONU ou do Conselho da UE sobre as importações ou exportações das commodities e de produtos relevantes.
Outros 50 estão na categoria de “risco padrão”, como grandes produtores agrícolas da América Latina, África e Ásia. No Mercosul, somente o Uruguai ficou como país de “baixo risco”, o que explica porque os uruguaios nunca se juntaram a outros países para questionar a lei europeia. Na Ásia, Vietnã e Tailândia também ficaram como países de baixo risco, provavelmente por terem aceitado bilateralmente certas exigências feitas por Bruxelas.
No total, 142 países foram classificados como tendo “risco baixo” de desmatamento. Essa classificação junta “amigos” do Ocidente, como Austrália e Canadá; potências com as quais a Europa quer ficar bem e teme retaliação como EUA, China e Índia; e países que provavelmente não tem nem mais o que desmatar. Os europeus dizem que a lista de classificação de risco foi aprovada por consenso pelos seus países-membro.
De toda maneira, com 50 países na categoria de risco médio, há um certo equilíbrio. Seria muito pior para o Brasil se essa categoria tivesse um número pequeno de países, comparado à grande maioria colocada como risco baixo.
Contexto
A classificação de risco-país leva em conta a produção dos sete produtos básicos abrangidos pelo Regulamento de Desmatamento da UE (EUDR) – gado, cacau, café, óleo de palma, borracha, soja e madeira e alguns de seus produtos derivados como couro, chocolate, pneus ou móveis. Essas commodities foram escolhidas com base em uma avaliação de impacto que as identificou como o principal fator de desmatamento devido à expansão agrícola, conforme a explicação de Bruxelas.
O plano europeu é interditar o acesso dessas commodities produzidas em zonas desmatadas após o fim de 2020. Exportadores terão que apresentar provas documentais de que sua produção não envolveu desmatamento fora desta data de corte, antes de poderem comercializar seus produtos nos 27 países membros da UE.
Implicação das classificações
A classificação de risco define a extensão das verificações de conformidade que os 27 países membros do bloco europeu precisão fazer. Significa controlar 9% dos operadores dos produtos originários de países considerados como “alto risco”, 3% dos produtos vindos de países com “risco padrão” e 1% dos produtos vindos de países com “baixo risco” de desmate.
Ou seja, a classificação de risco significa quantos contêineres vão ser controlados. As mercadorias originárias de países com risco maior terão maior controle e mais risco de autuações.
Assim, os 142 países na categoria de “baixo risco” terão obrigações simplificadas de “due diligence” para operadores e comerciantes. Eles precisarão coletar informações, mas não precisarão avaliar e mitigar os riscos do desmatamento. China, Índia e África do Sul estão nessa categoria.
Conforme a UE, a avaliação comparativa de países garantirá uma implementação simples, justa e econômica de sua lei antedesmate. O bloco diz que a lei já está produzindo desenvolvimentos positivos no combate ao desmatamento, às mudanças climáticas e à perda de biodiversidade. Já para produtores como o Brasil, a lei é equivocada e discriminatória.
As obrigações da lei passarão a ser aplicadas em 30 de dezembro deste ano para as grandes empresas e em 30 de junho de 2026 para as micro e pequenas empresas.
A publicação desta quinta-feira da lista de benchmarking é acompanhada por um documento de trabalho da equipe que descreve a metodologia em que o benchmarking se baseia.
Alterações recentes
Recentemente, a Comissão Europeia anunciou medidas para reduzir a carga burocrática na implementação de sua legislação antidesmate, visando reduzir custos para as empresas, e pode ter impacto positivo no fluxo de vendas brasileiras. A flexibilização reflete também o novo contexto geopolítico.
Segundo a Comissão Europeia, isso resultará numa redução estimada em 30% dos custos e encargos administrativos para as empresas demonstrarem que seus produtos são livres de desmatamento (Globo Rural)