Tarifa dos EUA pode gerar perdas anuais de até US$ 17 bilhões nas exportações brasileiras e reduzir investimentos estrangeiros, alerta especialista

O anúncio da tarifa de 50% sobre todos os produtos brasileiros importados pelos Estados Unidos, feito pelo presidente Donald Trump nesta semana, tem efeitos imediatos no comércio exterior brasileiro. A medida, que passa a valer em 1º de agosto, é vista por analistas como uma ‘tarifa política’ e inverte a lógica das sanções tradicionais dos EUA. Segundo o especialista em comércio exterior Rogério Marin, CEO da Tek Trade e presidente do Sindicato das Empresas de Comércio Exterior de Santa Catarina (SINDITRADE), o prejuízo anual para as exportações do Brasil pode variar entre US$ 12 bilhões e US$ 17 bilhões (R$ 70 bilhões a R$ 100 bilhões), o que representa entre 3,6% e 5% das exportações totais do país. Esta estimativa, segundo a métrica adotada pela CNI, pode representar uma perda de 432 mil a 612 mil empregos. Em termos de PIB, Marin estima um impacto negativo entre 0,6 e 0,8% ao ano no PIB total brasileiro.

“Não estamos diante de uma tarifa econômica, mas sim de uma ‘tarifa política’, já que os números da cadeia de comércio entre os dois países contradizem os argumentos apresentados pelo presidente Donald Trump de que o Brasil estaria se utilizando de ‘práticas comerciais injustas’. O impacto deve ser sentido principalmente nas exportações da indústria de transformação, que representa mais de 78,3% das vendas brasileiras aos americanos”, explica Marin. 

Em 2024, os EUA absorveram 12% das exportações brasileiras, totalizando US$ 40,3 bilhões, segundo a Amcham Brasil e o Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC). Conforme o especialista, a nova tarifa encarecerá produtos brasileiros em até US$ 20,15 bilhões por ano, reduzindo sua competitividade frente a fornecedores do México e Canadá, por exemplo, e pode provocar uma queda de até 42% nas exportações do Brasil para os EUA. Entre os setores mais afetados estão petróleo, aço, aeronaves, café e carne bovina. Só o aço e o alumínio devem registrar uma queda superior 11,2%, o equivalente a US$ 1,5 bilhão nas exportações, segundo o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).

Apesar da forte repercussão nas exportações, Marin chama atenção para um risco ainda maior: o Investimento Estrangeiro Direto (IED). Os EUA respondem por mais de 25% do IED no Brasil, com um estoque de US$ 300 bilhões. “O elefante na sala é o IED. Sem ele, a modernização da infraestrutura que dá suporte a expansão da economia brasileira fica comprometida. Isso representa um risco econômico maior do que as exportações ou a balança comercial, caso o governo americano demonstre desinteresse em investir no Brasil. Setores como tecnologia, automotivo e energia, que empregam diretamente milhares de trabalhadores, seriam os mais afetados, com impactos no PIB e no mercado de trabalho. A solução precisa ser diplomática”, alerta.

Os reflexos no mercado interno também devem ser sentidos. Produtos como o café, principal item exportado para os EUA no segmento de alimentos, podem ter redução de preço no mercado brasileiro, pela dificuldade de destinação a outros países. 

Sul pode perder até US$ 2,3 bilhões

A Região Sul, responsável por quase 30% das exportações brasileiras para os EUA, também deve sentir os efeitos. Segundo Rogério Marin, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul podem sofrer perdas anuais estimadas entre US$ 1,6 bilhão e US$ 2,3 bilhões (R$ 9 bilhões a R$ 13 bilhões), o equivalente a 4,7% e 6,8% das exportações totais da região Sul. O impacto nos empregos pode variar entre 50 mil e 70 mil postos de trabalho perdidos, com reflexos no PIB regional entre 0,7% e 1%. Setores como carnes, madeira, móveis e químicos tendem a sofrer mais.

Em Santa Catarina, estado com forte base industrial, as perdas anuais podem atingir US$ 700 milhões, afetando principalmente os segmentos de carne de aves e suína, motores elétricos e móveis. No Paraná, o impacto pode alcançar US$ 2,3 bilhões, com queda de até 35% nas exportações, em especial na agroindústria e na indústria de transformação. Produtos como soja e carnes de aves enfrentarão forte concorrência. Já o Rio Grande do Sul pode perder até 30% de suas exportações, um impacto estimado de US$ 950 milhões, sobretudo em químicos e carnes.

“Os impactos variam conforme a dependência de cada estado ao mercado norte-americano e a composição de suas exportações. A tarifa pode ampliar o déficit comercial dos estados do Sul com os EUA, que em 2024 foi de US$ 0,9 bilhão. A redução nas exportações pode impactar o PIB regional em até 1%, com efeitos em cadeias produtivas locais”, conclui Marin.


Taxação dos EUA: ameaça ou oportunidade para a indústria brasileira?

Fábio Siebert e Marcello Lauer, da Grand Hill, recomendam planejamento jurídico e financeiro e destacam as vantagens estratégicas em outros países, como por exemplo, Costa Rica

Com a recente proposta de Donald Trump de aumentar em 50% as tarifas sobre produtos brasileiros, empresários e investidores começam a repensar rotas estratégicas de exportação e presença internacional. Para o Senior Partner da Grand Hill Fábio Siebert, o momento exige cautela e rápida tomada de decisão na gestão e reposicionamento.

“Essa possível taxação precisa ser tratada com pragmatismo. Em vez de entrarmos em pânico, devemos ampliar o radar e entender que o mundo oferece alternativas sólidas para superar essas barreiras. A Costa Rica é uma delas”, afirma Siebert.

O país centro-americano, segundo o executivo, pode funcionar como uma ponte para o acesso a mercados com os quais o Brasil perderia competitividade, inclusive neste caso dos EUA. “A Costa Rica possui acordos de livre comércio com países que representam dois terços do PIB mundial. Além disso, suas Zonas Francas oferecem benefícios fiscais atrativos, com estrutura moderna e estabilidade institucional”, destaca.

Siebert explica que a mudança de estratégia não significa abandonar os EUA, mas ampliar horizontes. “Muitas empresas brasileiras podem se beneficiar com uma presença híbrida, mantendo suas operações locais e instalando braços produtivos ou comerciais em países estratégicos. É uma forma de garantir acesso a mercados-chave mesmo diante de novos entraves comerciais.”

Mas além de buscar novos caminhos internacionais, é preciso agir com celeridade nas decisões internas. Para o Senior Partner da Grand Hill, Marcello Lauer, as empresas devem adotar imediatamente um plano de ação para mitigar riscos e evitar surpresas negativas. “É importante que as empresas adotem, o mais rápido possível, um plano de trabalho para analisar os impactos da alteração tarifária. Isso não pode ser deixado para depois”, alerta.

Lauer recomenda um diagnóstico completo das relações comerciais da empresa. “É fundamental analisar todos os contratos, pedidos e acordos existentes e avaliar quais seriam os impactos caso a taxação seja, de fato, implementada. Só com esse mapeamento será possível tomar decisões embasadas”, explica.

Outro ponto crítico é a construção de um mapa de riscos que permita entender o grau de exposição da empresa e sua vulnerabilidade frente à concorrência. “É preciso verificar se existe a possibilidade de a empresa ser substituída em determinados mercados e quais os reflexos disso em toda a cadeia de fornecimento”, aponta.

Na visão do especialista, a teoria da imprevisão também deve ser considerada como ferramenta jurídica preventiva. “Em alguns casos, a alteração de tarifas pode configurar um evento imprevisto e extraordinário, o que justifica a revisão de contratos sob esse argumento. Essa análise deve ser feita caso a caso, com apoio jurídico qualificado”, observa Lauer.

Além disso, ele destaca a importância de avaliar os reflexos da mudança no fluxo de caixa e na perspectiva de continuidade operacional. “É um momento delicado, que exige atenção redobrada à saúde financeira da empresa. Negociar preventivamente com credores e fornecedores estratégicos pode ser decisivo para atravessar esse cenário com mais segurança”, recomenda.

Na avaliação de Siebert, o desafio está lançado, mas também é uma oportunidade para que as empresas brasileiras repensem seus modelos de atuação com mais inteligência e agilidade. “É nas crises que surgem os caminhos menos óbvios. Cabe às lideranças enxergar além do problema imediato, elaborar os estudos e agir com estratégia, buscando alternativas que garantam competitividade e sustentabilidade no médio e longo prazo”, finaliza

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