Por Ricardo Mussa
P&D&I podem acelerar as transformações para cumprir metas ambientais do país.
Sempre digo que o Brasil tem plenas condições de liderar a caminhada global da transição energética.
Para compreender todos os contextos nessa jornada, recomendo um estudo recente da Shell, uma das principais empresas de energia do mundo.
O documento estipula dois horizontes. No cenário “Sky 2050”, mais desafiador, o Brasil alcança a neutralidade de emissões líquidas de gases de efeito estufa em 2050, conforme compromisso assumido para cumprir os objetivos do Acordo de Paris.
Já no cenário “Arquipélagos”, essa neutralidade é restrita somente ao CO₂ e é atingida no começo dos anos 2060. Nas duas hipóteses, as conquistas brasileiras já estarão à frente da maioria dos países.
De um modo ou de outro, tenho certeza de que tais objetivos só serão alcançáveis com investimentos certeiros —públicos e privados— em pesquisa, desenvolvimento e inovação (P&D&I).
Do lado governamental, logo depois da COP28, ainda em 2023, o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação anunciou cinco editais que contemplam projetos para transição energética.
Outro instrumento bem-sucedido é a cláusula que fixa um percentual para investimentos em P&D&I em contratos de exploração e produção de petróleo e gás natural, conforme a Lei 9.478/1997.
Até 2022, essa cláusula permitiu aportes que totalizaram R$ 26,25 bilhões, com 186 instituições de pesquisa e desenvolvimento tecnológico no país habilitadas, segundo a ANP (Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis), que regulamenta e fiscaliza a aplicação dos recursos.
E o que esse investimento vem trazendo de bom?
Parte desse orçamento tem foco no desenvolvimento de tecnologias de energias renováveis e no apoio a iniciativas de descarbonização, eficiência energética e redução de impactos ambientais.
Gostaria de citar dois exemplos concretos dos benefícios da cláusula: a construção da primeira estação experimental de abastecimento de hidrogênio (H2) renovável do mundo a partir do etanol, projeto com investimento total de R$ 50 milhões que une Shell Brasil, Hytron, Raízen, Senai CETIQT e a Universidade de São Paulo (USP), através do Centro de Pesquisa para Inovação em Gases de Efeito Estufa (RCGI); e a criação do novo Centro de Inovação em Tecnologia Offshore, uma parceria entre USP, Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT), Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo) e Shell Brasil, anunciado em junho, com investimento de R$ 163 milhões ao longo de cinco anos.
Recursos são importantes, mas o mais importante em inovação, como dizia Steve Jobs, é atrair gente boa e motivada. “Não se trata de dinheiro. São as pessoas que você tem, como você é liderado e quanto você consegue”, disse o cofundador da Apple.
Como mostra a história das empresas mais inovadoras do mundo, muitas das melhores ideias surgem da convivência entre times multidisciplinares —tanto de quem trabalha na operação e na área comercial, ouvindo as dores dos clientes, como das equipes dedicadas à pesquisa e desenvolvimento.
Os times de P&D&I precisam de autonomia, sim, mas não é recomendável que fiquem segregados. Não por acaso, para trazer um exemplo internacional, a Hitachi Energy anunciou neste mês vultosos investimentos para criar uma nova planta em Vasteras, na Suécia, que reunirá os escritórios, a fábrica para produtos de automação de rede e um centro de pesquisa e desenvolvimento.
Essa, aliás, é a história de sucesso da imensa evolução da indústria de biocombustíveis no Brasil. Aqui contamos com ótimos talentos e um propósito (Ricardo Mussa, engenheiro de produção, é CEO na Raízen desde 2020 e lidera a força-tarefa de transição energética e clima do B20 Brasil; Folha)