EUA: Montana aposta em frigoríficos locais para driblar domínio brasileiro

Estado tem mais gado do que pessoas, mas apenas cerca de 1% da carne consumida é criada e processada localmente.

Embora muitas pessoas tenham visões românticas das fazendas de Montana, nos Estados Unidos —com vastos vales, riachos gelados, montanhas cobertas de neve—, poucos entendem o que acontece quando o gado deixa essas pastagens. Acontece que a maioria não fica no estado.

Mesmo no estado onde o número de vacas é o dobro do de habitantes, apenas cerca de 1% da carne comprada pelas residências é criada e processada localmente, de acordo com estimativas da consultoria Highland Economics.

Como acontece no resto dos EUA, muitos habitantes de Montana preferem comer carne vinda de lugares distantes como o Brasil.

O destino comum de uma vaca que começa a vida no pasto de Montana é: ela será comprada por um dos quatro frigoríficos dominantes —JBS, Tyson Foods, Cargill e Marfrig— que processam 85% da carne do país; transportada por empresas como Sysco ou US Foods, distribuidoras com um valor combinado de mais de US$ 50 bilhões; e vendida em um Walmart ou Costco, que juntos recebem quase metade dos gastos com alimentos nos Estados Unidos.

Qualquer fazendeiro que queira escapar desse sistema —e, digamos, vender sua carne localmente, em vez de como commodities anônimas cruzando o país— são Davis em meio a uma multidão de Golias.

“Os frigoríficos têm muito controle”, disse Neva Hassanein, professora da Universidade de Montana que estuda sistemas alimentares sustentáveis. “Eles tendem a influenciar toda a cadeia de suprimentos.”

Para os fazendeiros do país, cujos lucros diminuíram ao longo do tempo, “é meio que uma armadilha”, disse.

Cole Mannix, 40, está tentando escapar dessa armadilha. Ele cresceu trabalhando em fazendas, o que membros de sua família têm feito desde 1882, e quer garantir que a próxima geração, a sexta, tenha a mesma oportunidade.

Em 2021, Mannix cofundou a Old Salt Co-op, uma empresa que quer revolucionar a forma como as pessoas compram carne.

Enquanto muitos fazendeiros de Montana vendem seus animais para a máquina industrial multibilionária quando eles têm menos de um ano de idade, sem nunca mais vê-los ou lucrar com eles, o gado da Old Salt nunca sai das mãos da empresa.

As vacas são criadas pelas quatro fazendas que formam a Old Salt. Elas são abatidas e processadas em suas instalações de processamento de carne, e vendidas através de seus restaurantes, eventos comunitários e site. Os fazendeiros, que têm participação na empresa, lucram em todas as etapas.

O termo técnico para essa abordagem —na qual uma empresa controla vários elementos de sua cadeia de suprimentos— é integração vertical. Não é algo que muitos pequenos negócios de carne tentam, pois requer uma grande quantidade de capital inicial.

“É um momento assustador”, disse Mannix, referindo-se à dívida considerável da empresa. “Estamos realmente tentando inventar algo novo”.

No entanto, disse que “não importa o quão arriscado seja iniciar um negócio como a Old Salt, o status quo é mais arriscado”.

Teria sido muito mais simples para a Old Salt abrir apenas uma instalação de processamento de carne, como alguns fazendeiros fizeram, e não se preocupar com restaurantes e eventos.

No entanto, foi aí que grande parte da atenção nacional se concentrou: a Casa Branca recentemente anunciou US$ 1 bilhão para processadores de carne independentes, citando a falta de concorrência aos principais frigoríficos.

Mas Mannix disse que isso não teria resolvido o outro problema que os fazendeiros enfrentam: a dificuldade de acessar distribuidores e clientes.

“Não importa se você tem uma boa instalação de processamento se não consegue vender o produto”, disse. “Você não pode reconstruir o sistema alimentar apenas jogando muito dinheiro em um componente desse sistema”.

A Old Salt é sua tentativa de reconstruir a coisa toda.

Andrew Mace, cofundador e diretor culinário da Old Salt, provavelmente não recomendaria começar cinco negócios em três anos. Mas ele disse que tudo isso faz parte do “plano muito ambicioso da empresa de reimaginar a economia local de carne”.

Embora Mace queira que todos os empreendimentos da Old Salt sejam lucrativos, o propósito maior deles é servir como veículos de marketing para o serviço de assinatura de carne —para os clientes se apaixonarem pelo contrafilé do restaurante Union e, em seguida, se inscreverem para receber o “pacote de bifes e costeletas” da empresa mensalmente.

Para os próximos cinco anos, o objetivo da Old Salt é vender carne para 10 mil famílias em todo o país por ano, acima das cerca de 800 atuais. Não será fácil: os americanos estão acostumados a comprar carne moída no supermercado, não em um site.

“É difícil interferir nos hábitos de gastos das pessoas e fazê-las entender que não estão apenas comprando carne, estão investindo nas paisagens locais”, disse Mace.

Isso importa para Mannix. Ele selecionou a dedo os membros da Old Salt de mais de 9.000 fazendas em todo o estado porque compartilham sua dedicação à pecuária regenerativa, um conjunto de princípios que busca repor os solos e reduzir o impacto ambiental do gado.

Seu objetivo principal é colocar mais dinheiro nas mãos desses fazendeiros para que possam dedicar mais tempo e dinheiro ao cuidado de suas terras. No total, as fazendas da Old Salt gerenciam mais de 800 quilômetros quadrados, uma área maior do que o Parque Nacional de Shenandoah.

Por isso, os fazendeiros da Old Salt são donos da maior parte da empresa e compartilham os lucros.

“Não queríamos ser uma empresa de carne que compra gado de fazendeiros e, no final das contas, à medida que cresce, tem incentivo para pagar o mínimo possível por esse gado”, disse Mannix.

“Isso deixa menos dinheiro para pagar pelo tempo necessário para realmente cuidar dos ecossistemas.”

Unir quatro fazendas sob uma única marca também permitiu aos membros reunir seus produtos e recursos de marketing, em vez de competir uns contra os outros.

“Tem que ter coragem para fazer o que eles estão fazendo, mas precisamos de pessoas na vanguarda para mostrar o caminho”, disse a professora da Universidade de Montana, Neva Hassanein (The New York Times)

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