Avanço do fogo foi mais rápido que resposta de governos, dizem boletins

Apesar de incremento adotado em meio à crise, área queimada triplicou em 3 meses no pantanal e dobrou na amazônia em setembro.

Os 13 boletins divulgados desde o final de junho pelo Ministério do Meio Ambiente sobre a crise das queimadas mostram que a escalada do fogo no pantanal, amazônia e cerrado ocorreu em velocidade bem superior ao incremento no combate aos incêndios feito pelos governos federal, estaduais e municipais.

Segundo os documentos, de julho até agora o acumulado da área queimada no pantanal triplicou de tamanho, chegando a 2 milhões de hectares —13,4% do bioma.

Na amazônia, a área queimada mais que dobrou neste mês de setembro —11,7 milhões de hectares, ou 2,8% do bioma. O cerrado já teve 12,3 milhões de hectares queimados em 2024, o que representa 6,2% de sua área total, com aumento de quase 40% só nos últimos 15 dias.

O incremento de brigadistas e aeronaves, tanto do governo federal, mas também dos estados (que compartilham a obrigação legal de combate), também cresceu no período, mas em proporção insuficiente para conter a crise.

No pantanal, da primeira quinzena de julho até agosto (auge da crise no bioma), o número de profissionais federais em campo —do Ibama, ICMBio, Forças Armadas e Força Nacional— cresceu 20%, chegando a cerca de 1.000, enquanto a quantidade de aeronaves foi de 14 para 19 no período.

Atualmente, com o arrefecimento da crise no bioma, o efetivo está na casa dos 800 agentes, com 11 aeronaves —os outros foram deslocados para outras partes do país.

Folha questionou Mato Grosso e Mato Grosso do Sul sobre o efetivo empenhado no combate, mas só o segundo estado respondeu. Disse que terminou junho com 70 bombeiros em ação, número que cresceu para 138 neste momento.

Na amazônia, o efetivo federal subiu pouco do final de agosto (quando o número começou a ser divulgado pelo Ministério do Meio Ambiente) até agora: de 1.468 para 1.608, com 10 aeronaves.

O estado de Tocantins afirmou que o combate ao fogo ainda não havia começado em junho, mas que agora há 355 bombeiros mobilizados. No Amazonas, neste período, o efetivo cresceu de 333 para 706. Já o Pará não respondeu —os três são recordistas de queimadas no Norte.

As médias móveis semanais de área queimada no cerrado começaram a subir de forma acelerada em agosto e atingiram o pico nas primeiras semanas de setembro.

Os boletins do Ministério do Meio Ambiente passaram a divulgar dados sobre o bioma somente no último dia 10. De acordo com o documento, o número de profissionais federais em campo mais que dobrou nesses últimos 15 dias, de 436 para 1.102. São 8 aeronaves em uso (eram 7 no boletim do dia 10).

“Existe uma responsabilidade compartilhada. Jogar toda a contabilidade no número de brigadistas federais não é honesto, é como se toda a responsabilidade de incêndios do Brasil fosse do governo federal, isso não é real”, diz o secretário extraordinário de Controle de Desmatamento do ministério, André Lima.

Segundo ele, 85% do fogo no cerrado e 73% do fogo no pantanal foram registrados em propriedades privadas, cuja responsabilidade de resposta primeiramente é dos estados e municípios —a União precisa cuidar de áreas de preservação e terras indígenas, majoritariamente.

“Se não tiver propriedade privada com suas brigadas, municípios com brigadas locais, bombeiros, estados com corpo de bombeiros, também aumentando o número de gente disponível, não tem condição de o governo federal resolver o problema”, diz ele.

Lima cita o exemplo de São Paulo. Segundo ele, no estado há uma menor cobrança em relação ao governo federal porque “são áreas estaduais e privadas e existe um efetivo, tanto privado, das grandes empresas, como do estado, de bombeiros”.

O governo do Amazonas diz, por outro lado, que atualmente mais de 70% dos focos de calor combatidos pelas equipes estaduais estão em áreas de responsabilidade federal e reclama que já em abril solicitava apoio à União.

Já em Rondônia, o Tribunal de Contas do Estado abriu um processo para apurar possível omissão do governo local no combate ao fogo. A reportagem procurou a gestão regional para comentar, mas não teve resposta.

O Brasil enfrenta em 2024 uma disparada das queimadas em meio à pior seca já registrada no país desde pelo menos os anos 1950.

A ministra Marina Silva (Meio Ambiente) e o próprio presidente Lula (PT) reconheceram que o governo federal, estados e municípios não estavam preparados para enfrentar a situação.

Além do Ministério do Meio Ambiente, a Folha também procurou as pastas da Justiça, Defesa, Agricultura, Desenvolvimento Regional e a Casa Civil, que coordena as ações.

A Casa Civil destacou a criação da Comissão Interministerial Permanente de Prevenção e Controle do Desmatamento e Queimadas, em 1º de janeiro de 2023, destacando que “as competências de combate aos incêndios florestais e à estiagem não são exclusivas da União” e que “estados e municípios também têm papel fundamental”.

Sobre a estrutura federal, a pasta respondeu que o Ibama e o ICMBio têm mais de 3.000 brigadistas em atuação neste ano e que em agosto foi autorizado incremento temporário em 20 estados, além da contratação pelo Ibama de mais 5 aeronaves.

A pasta destaca ainda a medida provisória que autorizou R$ 137 milhões para combate aos incêndios, entre outros aportes.

A Justiça disse que atua desde maio contra queimadas, com uso de 312 bombeiros da Força de Segurança em 22 municípios da Amazônia Legal e pantanal.

“O ministério aumentou em mais de 400% os repasses para operações de proteção aos biomas e combate aos incêndios florestais, na comparação com todo o ano de 2022”, disse ainda a pasta, que registrou os 52 inquéritos abertos pela Polícia Federal e a atuação da Polícia Rodoviária Federal em patrulhamento intensificado nas margens das rodovias federais.

A Defesa disse que desde o fim de junho cerca de 550 militares têm atuado no pantanal, com o apoio de 161 viaturas, 224 embarcações e nove aeronaves.

Agricultura afirmou que faz parceria com autoridades federais, locais e representantes dos produtores rurais e que está monitorando os impactos das estiagens sobre a produção agropecuária.

Desenvolvimento Regional não respondeu (Folha)

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