Pela primeira vez, a China não faz compra antecipada do grão dos EUA até agosto.
A vida dos produtores americanos de soja não está fácil, e Donald Trump a torna ainda mais difícil. Os chineses, que em geral começam a fazer compra antecipada de soja americana a partir de julho, até agora não compraram nenhum grão da oleaginosa nesta safra 2025/26. É a primeira vez que isso ocorre no relacionamento comercial entre os dois países.
Normalmente, neste período do ano, pelo menos 14% das importações que serão feitas pela China já estariam encomendadas. Na safra 2022/23, foram 27%.O problema maior para os produtores é que o tão esperado acordo propalado por Trump nunca chega. E a janela de compras está ficando curta. Desde a primeira guerra comercial, promovida pelo presidente dos Estados Unidos, os chineses diminuíram muito as compras no mercado americano, optando pelo Brasil.
A China importa um volume maior de soja brasileira no primeiro semestre e complementa a sua demanda com produto americano entre novembro e janeiro. A falta de um acordo e a tarifa atual de 20% para o produto americano entrar em território chinês eliminam a possibilidade de compra do produto dos Estados Unidos pela China. A América do Sul não tem essa taxa.
Dados da AgRural indicam que na sexta-feira (22) a soja brasileira, com embarque para outubro com destino à China, valia US$ 490 a tonelada. A americana, com origem nos portos do Pacífico, US$ 535, devido à taxa imposta pelos chineses. No ano passado, para o mesmo período, a soja brasileira chegava por US$ 453, e a americana, por US$ 434.
A ausência dos chineses no mercado dos Estados Unidos se deve a esses preços menos competitivos do produto americano e a uma espera da definição da safra brasileira 2025/26, que poderá superar os 170 milhões de toneladas colhidos neste ano. O mercado, em tom de brincadeira, diz que Trump pode estar certo ao dizer que os chineses vão quadruplicar a compra de soja americana. Afinal, zero (o tanto comprado até agora) vezes quatro é zero. Brincadeiras à parte, os Estados Unidos não têm soja suficiente para quadruplicar a oferta para a China. Até porque houve redução de área e queda na produção neste ano.
Daniele Siqueira, analista da AgRural, diz que o acordo entre chineses e americanos têm de sair nas próximas semanas. Caso contrário, o período das compras fica curto. Ela acredita que os chineses vão ter de comprar um pouco do produto dos Estados Unidos, uma vez que não conseguem fazer essa ponte de uma safra brasileira para outra. A China volta forte ao mercado brasileiro a partir de fevereiro.
Na safra 2024/25, que encerra em 31 de agosto, a China importou 22,5 milhões de toneladas de soja dos Estados Unidos, um volume inferior aos 24 milhões de 2023/24. A nova ameaça de Trump de colocar 200% de tarifa nas importações chinesas, devido às dificuldades com o acordo no comércio de terras raras, coloca esse patamar de volume ainda mais distante.
A opção chinesa por mais soja brasileira pode elevar os prêmios pagos pelo produto do Brasil. Com isso, a soja nacional fica com preços menos competitivos em outros mercados, que devem optar pelo produto americano, segundo Daniele. Não deixa de ser um perigo porque o Brasil fica ainda mais dependente da China, mas os Estados Unidos se distanciam cada vez mais do principal mercado importador.
Daí a ASA (Associação Americana de Soja) afirmar que os produtores americanos estão à beira de um precipício comercial e financeiro, e que não podem sobreviver com uma disputa comercial prolongada com o principal cliente.
Antes da guerra comercial no primeiro mandato de Trump, os americanos exportavam o correspondente a US$ 12,8 bilhões em soja para os chineses. Em 2018/19, as receitas caíram para US$ 4,7 bilhões, e os Estados Unidos não voltaram mais a ter a mesma participação no mercado da China.
Dados desta terça-feira (26/8) da Anec (Associação Nacional dos Exportadores de Cereais) indicam que o Brasil fecha agosto com exportações acumuladas de 88,6 milhões de toneladas no ano, e a China deverá ficar com 75% desse volume (Folha)