Pecuaristas apostam em produção de carne de alta qualidade

Com aumento da produtividade, Brasil sofre pressão na disputa internacional pelo mercado de carne bovina.

Uma conjunção de fatores internos e externos abriu uma janela de oportunidade para o Brasil ampliar o rebanho e enfrentar a disputa acirrada do mercado internacional de carne bovina de alta qualidade, com mais marmoreio.

Palavra pouco conhecida dos brasileiros, o marmoreio é a gordura entremeada na carne, que dá mais maciez e sabor e garante maior rentabilidade aos produtores.

Pecuaristas que trabalham com a tecnologia de ultrassonografia de carcaça, usada na melhoria da genética dos animais, falam que é a “hora da virada” para o rebanho brasileiro.

Entre os fatores favoráveis para o Brasil no cenário atual, está a redução no tamanho dos rebanhos nos três maiores produtores de carne: Estados Unidos, Austrália e Brasil. As razões vão desde problemas climáticos, como a seca, até a falta de mão de obra para lidar com o rebanho nos Estados Unidos.

Na Austrália, queimadas. No Brasil, o avanço da agricultura nas áreas de pecuária no Brasil. Os pequenos pecuaristas se viram seduzidos pelos ganhos com arrendamentos da agricultura, e muitos animais foram para o gancho, como os pecuaristas costumam chamar o abate.

Outros fatores são o uso maior de tecnologia para aumentar a rentabilidade do rebanho no Brasil e, por outro lado, um consumidor que também começou a demandar carne de qualidade —não apenas para o tradicional churrasco de fim de semana. Por último, a medicina, que está mais favorável e deixou de colocar a carne como vilã da saúde.

O Brasil é hoje o maior produtor de carne bovina do mundo, mas sofre com o carimbo no exterior de que não produz carne de boa qualidade. A pressão internacional contra a carne brasileira tem aumentado à medida que o país aumenta a sua produtividade.

Em novembro, o Carrefour na França anunciou veto à carne originária dos países do Mercosul, entre eles, o Brasil. A decisão abriu uma crise e levou a um boicote promovido por frigoríficos brasileiros contra a varejista.

No mais recente episódio, a China anunciou, no final de 2024, que abriu uma investigação sobre a carne bovina para identificar se o aumento das exportações afetou os produtores locais.

A medida tem impacto direto no Brasil, responsável por 42% do valor total do comércio de carne bovina para a Ásia. Em 2024, as exportações brasileiras de carne bovina para o país somaram mais de 1 milhão de toneladas, representando aumento de 12,7% em relação ao mesmo período de 2023.

“Se a gente multiplicar a carne prime, em vez de ficar multiplicando a carne commodity [mais barata], o Brasil será em breve, em menos de 10 anos, o primeiro fornecedor de carne. Vai brigar com a carne prime americana muito pau a pau. Eles estão preocupadíssimos”, diz Valéria Guimarães, pecuarista da quarta geração de uma família goiana, que produz há 121 anos num dos berços da raça tabapuã no Brasil, animal mocho e branco. Ela está redirecionando a sua produção centenária para a carne marmorizada.

“Essa é a grande chance que a gente vê de melhorar a rentabilidade nas fazendas e conquistar outros mercados. Os rebanhos de qualidade estão pequenos. A demanda é muito maior do que a produção”, diz Fabio Almeida, pecuarista de São Paulo.

“O Brasil vende muito a carne commodity, que é barata e não tem a qualidade em termos de suculência”, afirma Almeida, que desenvolve há 22 anos o projeto Nelore do Golias, que busca resgate do sangue de um touro importado da Índia em 1962. O resultado foi a produção de uma carne ganhadora de prêmios.

Para o presidente da Assocon (Associação Nacional dos Confinadores), Mauricio Velloso, o uso maior da ultrassonografia de carcaça será um divisor de águas na produção brasileira, como foi para o rebanho americano.

“Os americanos passaram a ter uma carcaça de melhor qualidade, que é um esqueleto em que cabe mais carne”, afirma. Por meio da observação do boi por dentro, é possível fazer uma seleção genética para produzir um animal com mais carne e marmoreio

Segundo Velloso, com essa tecnologia, se consegue algo nunca obtido, que é conferir à genética, a precisão matemática. “Não adianta você olhar o boi por fora e achar bonito.”

A zootecnista Liliane Suguisawa ressalta que a pecuária no Brasil passou por processo de aumento de escala de produção sem olhar muito para a qualidade do produto. “A gente só massificou, aumentou muito o rebanho e ficamos produzindo uma carne ruim. Quando os países ricos compram a nossa carne, é para fazer embutidos, enlatados, carne de pet”, diz a pesquisadora, pioneira do uso da tecnologia no Brasil.

O processo usa uma sonda captadora de imagens no meio do animal e observa o volume de carne, a espessura de gordura subcutânea e a presença do marmoreio. Quanto mais, melhor. Os filhotes também recebem essa herança.

O especialista em pecuária Mauricio Nogueira, diretor da consultoria Athenagro, destaca o aumento de 190% competividade da pecuária nacional entre o ínicio da década de 1990 e a média dos últimos três anos (2021 a 2024). A produtividade média aumentou 190% no período.

Nesse período, o incremento nas exportações foi de 640%, enquanto houve acréscimo de 98% na disponibilidade de carne no mercado interno. Esse avanço da produtividade tem chamado atenção, como a reação dos franceses à carne brasileira.

“Eles vão amolar, dizendo que a gente tem algum problema. Mas nós estamos hoje totalmente preparados para atender todas essas demandas. O nosso potencial é muito maior ainda”, afirma. “Isso assusta muito os produtores de outros países”.

Roberto Barcellos, especialista em carne com marmoreio, avalia que o país tem condições de ampliar o nicho da carne com mais marmoreio. Mas falta ao Brasil, na avaliação dele, a criação pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento um programa de tipificação e classificação de carcaça para remunerar o produtor de acordo com as características do produto que ele entregou. “Esse modelo iria meio que definir o produto, o preço e os prêmios” (Folha)

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