O Brasil não tem onde estocar o volume de grãos que produz. De 2010 a 2023, segundo dados da Conab (Companhia Nacional de Abastecimento), o crescimento da safra de grãos foi de 134%, enquanto a capacidade de armazenagem cresceu 53%. Tamanha eficiência na lavoura torna-se um problema logístico, implicando em perdas de produtividade e rentabilidade.
Segundo o órgão, o país consegue armazenar 210 milhões de toneladas de grãos. Na safra 2024/25, a colheita estimada é de 322,3 milhões de toneladas. Mesmo a conta não fechando, o órgão alega que “não se pode afirmar que o país possui um déficit de armazenagem de 112,3 milhões de toneladas”.
A existência de três safras de grãos, para a Conab, é uma “vantagem comparativa que minimiza o déficit de armazenagem”, pois possibilita “maior movimentação dos produtos dentro do armazém, durante todo o ano, o que reduz a necessidade de novas estruturas armazenadoras”.
De olho no campo, a Câmara Setorial de Equipamentos para Armazenagem de Grãos da Abimaq (Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos) fala em “colapso logístico no pós-colheita”.
Segundo a própria Conab, um dos principais objetivos da armazenagem é “facilitar a negociação de melhores preços, tanto no território nacional como no mercado de exportação, proporcionando maior estabilidade de preços e de mercados”.
No entanto, o órgão se contradiz quando admite que em algumas regiões – como Maranhão, Tocantins, Piauí, Bahia, Sergipe e Alagoas-, “verifica-se um déficit maior de estruturas armazenadoras, o que, muitas vezes, obriga os produtores a destinarem imediatamente a sua produção para o exterior”.
Ao todo, 98% da safra está em armazéns privados e somente 2% estão em infraestruturas públicas. Vale esclarecer que não há problema em haver armazéns privados, mas só uma parcela de produtores e cooperativas consegue arcar com os custos milionários para construir essas infraestruturas.
“Armazenagem é importante, porque dá a segurança de o produtor comercializar o produto no momento mais favorável, e não porque o produto está perecendo”, observa André Farias, analista da Embrapa Territorial.
A unidade da Embrapa publicou, em dezembro, um sistema de inteligência com dados do setor agropecuário, incluindo informações do Sistema Nacional de Cadastro de Unidades Armazenadoras da Conab. O objetivo é dar condições de fazer política pública fundamentada em dados científicos e técnicos. “A ideia é que isso seja utilizado de maneira massiva pelo setor, trazendo ganhos técnicos nas escolhas que são tomadas por gestores públicos e iniciativa privada”, afirma.
Ainda segundo a Conab, uma possibilidade de arrefecer o problema da armazenagem é o programa de financiamento para Construção e Ampliação de Armazéns (PCA), voltado a produtores e cooperativas rurais. Ainda assim, tomar crédito com juros que variam de 7% a 8,5% ao ano, com prazo de reembolso de até 10 anos, nem sempre é viável ao produtor rural de pequeno e médio porte.
Dentro dessa realidade dos grãos, está a dupla arroz e feijão. Dos 210 milhões de toneladas que podem ser estocados, há espaço para guardar somente 22 milhões de toneladas de produtos que requerem armazéns convencionais, como é o caso de arroz, feijão e café. O restante da capacidade de armazenagem (88%) é para soja, milho, trigo, e outras commodities majoritariamente exportadas.
Sobre isso, a Conab alega que, desde 2023, “vem recebendo investimento recorde”. A média de investimentos anuais entre 2014 e 2022 era de R$ 2,5 milhões. Em 2023 e 2024, houve aportes de R$ 12 e R$ 13 milhões. A expectativa de investimentos para 2025 é superior a R$ 60 milhões.
Mas, se a própria Conab, fala em redução de necessidade de novas estruturas armazenadoras… para que seriam estas quantias?
Depois de explicações controversas em nota, o órgão conclui: “A capacidade armazenadora brasileira é um desafio frente à forte expansão da produção, mas que vem sendo enfrentado ao longo dos anos com investimentos públicos e, principalmente, privados” (UOL)
Dos bastidores da reportagem: a Conab e as perguntas antes da entrevista
Se você é jornalista, independente de atuar em redação ou agência, já deve ter lidado com aquele impasse de marcar uma entrevista e ouvir/dizer: “pode adiantar as perguntas para a fonte se preparar?”. Se você é quem concede entrevista, entendo querer se preparar antes, mas há controvérsias.
Bom, aqui vai meu relato recente sobre o quanto querer ser compreensiva com este tipo de pedido pode ser um tiro no pé – de várias formas. Vou contar os bastidores da entrevista com a CONAB – Companhia Nacional do Abastecimento, publicada na última sexta em newsletter no UOL – Universo Online.
Semana passada, acompanhando a repercussão da pauta de armazenamento de grãos, decidi ouvir a Conab, por ser o órgão oficial do governo. Por ter dúvidas das mais simples às mais complexas, pedi uma entrevista por telefone, já querendo escapar de notas curtas sem muito o que dizer.
Marcamos – e confesso que já me surpreendeu a rapidez, pois geralmente os órgãos de governo demoram.
Depois de estar confirmado para dia 15, às 15h, aquele banho de água fria: “Você poderia nos enviar um roteiro de perguntas?”, questiona a assessoria da Conab. Primeiro, pensei ‘não’. O tema da armazenagem para o diretor de operações e abastecimento, ao meu ver, deveria ser algo para estar na ponta língua e discorrer sem dificuldades. Mas, eu quis ser legal (e fui ingênua rs).
Por entender ser uma pauta complexa, que talvez fosse requerer dados que não estariam decorados e na vontade de obter uma discussão de qualidade, enviei as perguntas antecipadamente.
Três horas antes da entrevista, a (não tão) surpresa assim: “Surgiram demandas para o diretor e estão sendo feitos ajustes na agenda dele”. Desmarcaram sem falar mais nada. Horas depois do prazo e com o texto já fechado, recebo um documento com seis páginas. Como cito na própria newsletter, a Conab se contradizia em vários momentos em explicações controversas.
Ao meu ver, este é o primeiro tiro no pé. Responderam, depois do deadline, para pelo menos se ausentarem do “não retornaram os questionamentos”. Porém, pecaram em atropelar informações e preferirem uma nota do que uma conversa. E o segundo tiro no pé, que é o pior, é não ser claro com o leitor. As dúvidas não são minhas, da Mariana, são de pessoas com quem venho conversando, colhendo depoimentos, insatisfações, e querem saber do governo federal qual a explicação.
O triste é saber que, se eu tivesse negado enviar as perguntas antes, talvez eles tivessem cancelado a entrevista da mesma forma. Enfim, lições para este louco universo da comunicação social.
Se você, fonte, não se sente preparado(a) para falar com jornalistas, então não aceite conceder entrevistas. Ou, contrate uma agência para ter media training. Se a pessoa quer se portar frente à imprensa ou o cargo exige, é preciso estar segura e dominar o tema o tempo inteiro, pois faz parte do trabalho. Treinar antes e estudar as perguntas-chave é dever de casa com a assessoria contratada.
O repórter minimamente experiente sabe identificar o porta-voz que fala com segurança e tranquilidade, daquele que decorou cada vírgula e fica desconfortável se sair do script. Além disso, assessores estão para facilitar a mediação, e resolver por escrito nem sempre é estratégico. Acho que vale a reflexão e a honestidade com repórter/editor.
O passo em falso que a Conab deu com as contradições no documento enviado, me lembrou como a comunicação dentro do governo federal parece ter sido colocada de lado, haja vista o que vimos de ruído no episódio do PIX. A diferença é que o PIX tem apelo social e a pauta viralizou nas redes sociais. Mas, em termos de comunicação clara, nenhum destes assuntos foi bem-sucedido (Linkedin)
Conab: Após superestimar safras de grãos déficit de armazenagem é minimizado
Cerimônia oficial de abertura da Agrishow/2024 sem público reuniu Nery Geller, ex-ministro e ex-secretário do Ministério da Agricultura demitido pelo “escândalo de importação de arroz da Conab”, Paulo Teixeira ministro do Desenvolvimento Agrário, Tirso Meirelles presidente sub judice da Federação da Agricultura do Estado de São Paulo – Faesp/Senar, ministra Luciana Santos da Ciência e Tecnologia e presidente nacional do PCdB, vice-presidente da República Geraldo Alckmin e ministro da Agricultura Carlos Fávaro
Logo no início do governo Lula 3, no que seria a cerimônia oficial de abertura da Agrishow 2023, quando o presidente criou a falsa narrativa de que o ministro da Agricultura Carlos Fávaro teria sido “desconvidado” e destilou seu ódio sobre o agronegócio chamando os produtores rurais de “fascistas”. Os fatos comprovados evidenciaram que o ministro Fávaro se acovardou e com medo de cruzar com o ex-presidente Jair Bolsonaro na feira, simplesmente cancelou sua participação.
A maior feira do agro da América Latina, pela primeira vez em sua história, deixou de ser prestigiada por representantes do governo federal. No ano passado, o governo federal anunciou que teria representantes na cerimônia oficial de abertura, que tradicionalmente ocorre numa segunda-feira. Assim que o presidente do Sindicato e da Associação Rural de Ribeirão Preto Paulo Junqueira anunciou novamente a presença de Bolsonaro à feira, seus promotores trataram de inovar e anteciparam a cerimônia para o domingo (28/4) informando que o evento não teria a presença do público.
Na manhã do mesmo domingo, coincidentemente no mesmo horário do que seria a cerimônia oficial de abertura da Agrishow/2024, Bolsonaro participou de um evento público que contou com dezenas de milhares de produtores rurais e populares e é apontado com o maior evento público promovido na história de Ribeirão Preto. O governador Tarcísio de Freitas deixou de participar do evento da Agrishow e ao lado do seu colega governador Ronaldo Caiado, de senadores, deputados federais e estaduais, prefeitos e vereadores, prestigiaram Bolsonaro que no dia seguinte, a exemplo de outras visitas feitas à Agrishow, teve recepção apoteótica por parte dos expositores e produtores rurais.
De lá para cá, Lula e seus ministros mantém o script de atacarem o agro. A ministra Marina Silva, do Meio Ambiente, que em sua gestão conseguiu bater no ano passado o recorde de queimadas na Amazônia, encontrou forma singular de chamar os produtores rurais de representantes do “ogro negócio”. Em agosto do ano passado, quando o interior do Estado de São Paulo sofreu ataques criminosos do PCC e do MST e ardia em chamas, a ministra tentou incriminar os produtores rurais pela onda de incêndios que trouxeram enormes prejuízos.
A denúncia tinha o aval do presidente Lula e mesmo da pesquisadora Luciana Gatti, coordenadora do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), que afirmou que os incêndios recentes são uma ação deliberada dos produtores rurais. Segundo Gatti, os produtores estariam provocando incêndios em áreas de cana-de-açúcar para facilitar a colheita e reduzir custos. O estranhamento aprofundou o distanciamento dos produtores rurais com o governo Lula e pesou para alavancar apoio aos candidatos comprometidos com as pautas do agro nas eleições municipais do ano passado. A esquerda sofreu a pior derrota da sua história.
Conab serve para disseminar fake news
Em artigo assinado pelo advogado e produtor rural Paulo Junqueira, ele denuncia que “Governo alavanca “fake news” para tentar diminuir protagonismo do agro” ao se referir aos dados e números divulgados pela Conab superestimando as previsões de safra para as culturas de soja, milho, café e arroz. Entidades representativas dos produtores destes grãos e renomadas consultorias nacionais e internacionais divergiram publicamente colocando sob suspeição as informações da Conab.
Na última sexta-feira, o UOL publica a matéria (abaixo transcrita) “Para Conab, ter três safras de grãos ‘minimiza déficit de armazenagem’” citando o iminente “colapso logístico no pós-colheita” denunciado pela Câmara Setorial de Equipamentos para Armazenagem de Grãos da Abimaq (Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos). Ao mesmo tempo, a jornalista Mariana Grilli, autora da matéria, publicou no Linkedin (abaixo transcrita) a dificuldade que encontrou para obter informações através da Assessoria de Imprensa da Conab.
Na manhã desta 2ª feira (20/1), a chefe do setor de imprensa da Conab Patricia Dias, foi instada a trazer uma resposta às denúncias que estão sendo feitas pelos produtores de soja, milho, café, arroz e também pela Associação Brasileira de Máquinas e Equipamentos, mas até agora nenhum pronunciamento oficial foi feito (BrasilAgro)