Texto precisa seguir um longo caminho de validação nos dois blocos econômicos, e ainda não há previsão de quando o acordo passaria a valer.
O acordo de livre comércio entre Mercosul e União Europeia foi anunciado nesta sexta-feira (6/12), por líderes do bloco sul-americano e pela presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen.
Apesar da expectativa pelo anúncio, que ocorre 25 anos após o início das negociações, o acordo ainda não possui nenhum efeito prático e imediato, e pode demorar até ser implementado.
Em nota, a União Europeia disse que o fim das negociações sobre os termos anunciados nesta sexta constitui apenas o “primeiro passo em direção à conclusão do acordo”.
Agora, o texto precisa seguir um longo caminho de validação nos dois blocos econômicos, e ainda corre o risco de ser reprovado na União Europeia, tendo em vista as manifestações contrárias de alguns governos europeus.
Quais são os próximos passos
Após o anúncio, os próximos passos na conclusão do acordo são:
- Revisão legal do texto;
- Tradução do texto para a língua inglesa, para todas as 23 línguas oficiais da União Europeia e para as duas línguas oficiais do Mercosul (português e espanhol);
- Assinatura dos líderes dos dois blocos;
- Encaminhamento do acordo para aprovação interna dos membros dos dois grupos — e, nesta etapa, o texto precisa passar pela aprovação do Conselho da União Europeia, possivelmente a etapa mais difícil em todo o trâmite;
- Conclusão dos trâmites de aprovação e ratificação das partes do compromisso em cumprir o acordo;
- Só, então, o acordo entre em vigor.
‘Acordo é uma vitória para a Europa’, diz Ursula von der Leyen sobre acordo entre Mercosul e União Europeia
Os blocos não apresentaram nenhum prazo para a conclusão de cada uma dessas etapas. O governo federal afirma que o acordo produzirá efeitos jurídicos no primeiro dia do mês seguinte à notificação da conclusão dos trâmites internos.
A aprovação interna pelos blocos segue caminhos diferentes em cada um dos blocos. No Mercosul, os parlamentos de cada um dos cinco países-membros — Brasil, Argentina, Uruguai, Paraguai e Bolívia — precisa analisar e aprovar o texto.
Já na UE, a aprovação passa pelo Conselho da União Europeia e pelo Parlamento Europeu (que reúne todos os países do grupo). Essa pode ser a etapa mais desafiadora, de acordo com especialistas, porque depende do consenso da maioria qualificada do bloco. (saiba mais abaixo)
Para isso, o acordo precisa ser aprovado por, pelo menos, 55% dos países que compõem o grupo. Porém, esses 55% precisam responder por, no mínimo, 65% da população total da UE.
Há um receio de que a França, país que tem protestado contra o acordo, consiga reunir outros países com grandes populações para barrar o acordo. Para isso, basta que países que respondam por 35% da população do bloco concordem com o governo francês.
Em entrevista à GloboNews, o professor de política internacional da UERJ, Paulo Velasco, afirma que uma aprovação do acordo pela maioria obriga os países da UE a cumprirem as regras acertadas. “A soberania comercial da União Europeia é da União Europeia”, disse.
Entenda as regras para aprovação na UE
Pela UE, o acordo precisa passar pelo Parlamento Europeu e pelo Conselho da União Europeia, os dois principais órgãos de decisão do bloco.
▶️ O Parlamento Europeu é composto por deputados europeus, sendo o número de representantes por país proporcional ao tamanho da população. Os poderes deste órgão são legislativos, de supervisão e orçamentários.
Entre as atribuições do Parlamento está decidir sobre os acordos internacionais. Assim, para ser aprovado, o acordo precisa da maioria simples dos votos dos eurodeputados.
O processo de votação é parecido com o que ocorre no Brasil: primeiro, as propostas são encaminhadas para as comissões parlamentares, que podem propor alterações ou rejeições e preparam a legislação, e depois vão para as sessões plenárias, que aprovam ou não os projetos.
▶️O Conselho da União Europeia é composto por ministros dos governos de cada país do grupo, e é responsável por negociar medidas de legislação, coordenar as políticas dos países do bloco, definir a política externa e de segurança, além de celebrar acordos entre a União Europeia e outros países, e aprovar o orçamento.
É o Conselho que precisa ratificar o acordo para que ele tenha validade.
Para ser aprovado pelo Conselho, o acordo precisa do aval da maioria qualificada dos componentes: pelo menos 55% dos países precisam concordar, sendo que estes devem responder por, no mínimo, 65% da população total do bloco.
Para barrar o acordo, são necessários quatro países contrários, respondendo por 35% ou mais da população do grupo.
Somente assuntos sensíveis, como regras de segurança e política externa, exigem a unanimidade de votos favoráveis para serem aprovados.Ministro da Agricultura comemora acordo entre Mercosul e União Europeia
O que é o Acordo de Associação Mercosul-União Europeia?
O acordo comercial entre o Mercosul e a União Europeia tem o objetivo de reduzir ou zerar as tarifas de importação e exportação entre os dois blocos.
Estão previstos tratados em temas importantes, tais como:
- Cooperação política;
- Cooperação ambiental;
- Livre-comércio entre os dois blocos;
- Harmonização de normas sanitárias e fitossanitárias (que são voltadas para o controle de pragas e doenças);
- Proteção dos direitos de propriedade intelectual; e
- Abertura para compras governamentais.
As negociações começaram em 1999 e um termo preliminar foi assinado em 2019. Desde então, o texto passou por revisões e exigências adicionais, principalmente por parte da União Europeia, devido à pressão imposta principalmente por agricultores dos países-membros.
O acordo não vale apenas para produtos agrícolas, mas foi esse setor que protagonizou boa parte dos embates. Um dos receios dos produtores é de que o tratado torne os alimentos sul-americanos mais baratos na UE, reduzindo a competitividade das mercadorias europeias.
Parte dos temas já havia sido resolvida em 2019. O texto, no entanto, precisava passar por processos de validação, como a ratificação dos parlamentos de todos os países envolvidos. Foi aí que o acordo travou.
As negociações foram retomadas apenas nos últimos meses, a pedido da Comissão Europeia. A presidente da entidade, Úrsula Von der Leyen, afirma que o acordo criaria a maior parceria de comércio e investimento que o mundo já viu, beneficiando ambas as regiões e atingindo 700 milhões de pessoas.
Em entrevista coletiva de anúncio do acordo nesta sexta, a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, disse que o “acordo com Mercosul é vitória para Europa”.
“Este é um acordo ganha-ganha, que trará benefícios significativos para consumidores e empresas, de ambos os lados. Estamos focados na justiça e no benefício mútuo”, disse.
“Ouvimos as preocupações de nossos agricultores e agimos de acordo com elas. Este acordo inclui salvaguardas robustas para proteger seus meios de subsistência.”
Desafios na conclusão do acordo
Agricultores europeus, principalmente os franceses, têm se manifestado contra a aprovação do acordo. A França é um dos maiores produtores agrícolas da UE e deve ser bastante prejudicada pelo acordo, já que a América do Sul tem grandes produtores de grãos e alimentos.
Os trabalhadores alegam que haveria uma concorrência desleal, já que, segundo eles, a produção desses alimentos no bloco sul-americano não está submetida aos mesmos requisitos ambientais e sociais, nem às mesmas normas sanitárias em caso de controles defeituosos que a europeia.
Do lado sul-americano, o acordo também divide opiniões. Apesar do potencial de trazer benefícios para os países do Mercosul, a leitura de especialistas é a de que o bloco também pode sofrer com a concorrência vinda da Europa, nos setores industriais, químicos e automobilísticos.
Na quinta-feira (e em diversas outras ocasiões), o presidente francês, Emmanuel Macron, classificou o acordo como “inaceitável” em seu estado atual.
Nesta sexta-feira, a ministra do Comércio da França, Sophie Primas, reafirmou a oposição do país ao acordo comercial entre a UE e o Mercosul, afirmando que o acordo vincula apenas a Comissão Europeia, e não os Estados-membros.
A ministra se comprometeu a resistir às próximas etapas do acordo, citando “preocupações sobre os impactos ambientais e agrícolas”.
Além da França, outro país que já se manifestou contra o acordo é a Polônia. Itália também está dividida sobre o assunto. (Bruna Miato, Isabela Bolzani, g1)
‘A luta não acabou’: França diz que lutará em cada passo contra a assinatura do acordo entre Mercosul e UE
A ministra do comércio exterior da França, Sophie Primas, afirmou nesta sexta-feira (6/12) que o país lutará contra a conclusão do acordo entre o Mercosul e a União Europeia “em cada passo do caminho”, ao lado dos Estados-membros do bloco que partilham de sua visão.
O acordo de livre comércio entre os dois blocos foi anunciado oficialmente na manhã desta sexta-feira pela presidente da Comissão Europeia, Ursula Von der Leyen, após a reunião dos líderes dos blocos na cúpula do Mercosul em Montevidéu, no Uruguai. As negociações já duravam 25 anos.
Há anos a França tem se manifestado contra o andamento do acordo, afirmando que os produtos agrícolas do Mercosul entrariam na Europa em condições “desiguais de competitividade”, o que prejudicaria a produção local.
Nos últimos meses, agricultores franceses chegaram a fazer manifestações e protestos contrários à assinatura do acordo.
“A luta não acabou”, escreveu a ministra francesa em sua conta na rede social X.
Primas disse ainda que o que está acontecendo em Montevidéu, na Cúpula dos Chefes de Estado do Mercosul, não é a assinatura do acordo, mas sim a conclusão política da negociação.
“Isso não vincula os Estados-Membros. Cabe agora ao Conselho Europeu e depois ao Parlamento Europeu exprimirem-se. A França lutará em cada passo do caminho ao lado dos Estados membros que partilham a sua visão.”
A assinatura do acordo só acontece depois que os textos passarem por uma revisão jurídica e de serem traduzidos para os idiomas oficiais dos países envolvidos.
Além da França, outro país que já se manifestou contra o acordo é a Polônia. Áustria, Holanda e Itália também estão divididas sobre o assunto.
Quais os próximos passos na implementação do acordo?
Apesar da expectativa pelo anúncio, que ocorre 25 anos após o início das negociações, o acordo ainda não possui nenhum efeito prático e imediato, e pode demorar até ser implementado.
Em nota, a União Europeia disse que o fim das negociações sobre os termos anunciados nesta sexta constitui apenas o “primeiro passo em direção à conclusão do acordo”.
Agora, o texto precisa seguir um longo caminho de validação nos dois blocos econômicos, e ainda corre o risco de ser reprovado na União Europeia, tendo em vista as manifestações contrárias de alguns governos europeus.
Após o anúncio, os próximos passos na conclusão do acordo são:
- Revisão legal do texto;
- Tradução do texto para a língua inglesa, para todas as 23 línguas oficiais da União Europeia e para as duas línguas oficiais do Mercosul (português e espanhol);
- Assinatura dos líderes dos dois blocos;
- Encaminhamento do acordo para aprovação interna dos membros dos dois grupos — e, nesta etapa, o texto precisa passar pela aprovação do Conselho da União Europeia, possivelmente a etapa mais difícil em todo o trâmite;
- Conclusão dos trâmites de aprovação e ratificação das partes do compromisso em cumprir o acordo;
- Só, então, o acordo entre em vigor.
Os blocos não apresentaram nenhum prazo para a conclusão de cada uma dessas etapas. O governo federal afirma que o acordo produzirá efeitos jurídicos no primeiro dia do mês seguinte à notificação da conclusão dos trâmites internos.
A aprovação interna pelos blocos segue caminhos diferentes em cada um dos blocos. No Mercosul, os parlamentos de cada um dos cinco países-membros — Brasil, Argentina, Uruguai, Paraguai e Bolívia — precisa analisar e aprovar o texto.
Já na UE, a aprovação passa pelo Conselho da União Europeia pelo Parlamento Europeu (que reúne todos os países do grupo). Essa pode ser a etapa mais desafiadora, de acordo com especialistas, porque depende do consenso da maioria qualificada do bloco. (saiba mais abaixo)
Para isso, o acordo precisa ser aprovado por, pelo menos, 55% dos países que compõem o grupo. Porém, esses 55% precisam responder por, no mínimo, 65% da população total da UE.
Há um receio de que a França, país que tem protestado contra o acordo, consiga reunir outros países com grandes populações para barrar o acordo. Para isso, basta que países que respondam por 35% da população do bloco concordem com o governo francês.
Em entrevista à GloboNews, o professor de política internacional da UERJ, Paulo Velasco, afirma que uma aprovação do acordo pela maioria obriga os países da UE a cumprirem as regras acertadas. “A soberania comercial da União Europeia é da União Europeia”, disse.
Entenda as regras para aprovação na UE
Pela UE, o acordo precisa passar pelo Parlamento Europeu e pelo Conselho da União Europeia, os dois principais órgãos de decisão do bloco.
▶️ O Parlamento Europeu é composto por deputados europeus, sendo o número de representantes por país proporcional ao tamanho da população. Os poderes deste órgão são legislativos, de supervisão e orçamentários.
Entre as atribuições do Parlamento está decidir sobre os acordos internacionais. Assim, para ser aprovado, o acordo precisa da maioria simples dos votos dos eurodeputados.
O processo de votação é parecido com o que ocorre no Brasil: primeiro, as propostas são encaminhadas para as comissões parlamentares, que podem propor alterações ou rejeições e preparam a legislação, e depois vão para as sessões plenárias, que aprovam ou não os projetos.
▶️O Conselho da União Europeia é composto por ministros dos governos de cada país do grupo, e é responsável por negociar medidas de legislação, coordenar as políticas dos países do bloco, definir a política externa e de segurança, além de celebrar acordos entre a União Europeia e outros países, e aprovar o orçamento.
É o Conselho que precisa ratificar o acordo para que ele tenha validade.
Para ser aprovado pelo Conselho, o acordo precisa do aval da maioria qualificada dos componentes: pelo menos 55% dos países precisam concordar, sendo que estes devem responder por, no mínimo, 65% da população total do bloco.
Para barrar o acordo, são necessários quatro países contrários, respondendo por 35% ou mais da população do grupo.
Somente assuntos sensíveis, como regras de segurança e política externa, exigem a unanimidade de cotos favoráveis para serem aprovados.
O que é o Acordo de Associação Mercosul-União Europeia?
O acordo comercial entre o Mercosul e a União Europeia tem o objetivo de reduzir ou zerar as tarifas de importação e exportação entre os dois blocos.
Estão previstos tratados em temas importantes, tais como:
- Cooperação política;
- Cooperação ambiental;
- Livre-comércio entre os dois blocos;
- Harmonização de normas sanitárias e fitossanitárias (que são voltadas para o controle de pragas e doenças);
- Proteção dos direitos de propriedade intelectual; e
- Abertura para compras governamentais.
As negociações começaram em 1999 e um termo preliminar foi assinado em 2019. Desde então, o texto passou por revisões e exigências adicionais, principalmente por parte da União Europeia, devido à pressão imposta principalmente por agricultores dos países-membros.
O acordo não vale apenas para produtos agrícolas, mas foi esse setor que protagonizou boa parte dos embates. Um dos receios dos produtores é de que o tratado torne os alimentos sul-americanos mais baratos na UE, reduzindo a competitividade das mercadorias europeias.
Parte dos temas já havia sido resolvida em 2019. O texto, no entanto, precisava passar por processos de validação, como a ratificação dos parlamentos de todos os países envolvidos. Foi aí que o acordo travou.
As negociações foram retomadas apenas nos últimos meses, a pedido da Comissão Europeia. A presidente da entidade, Úrsula Von der Leyen, afirma que o acordo criaria a maior parceria de comércio e investimento que o mundo já viu, beneficiando ambas as regiões e atingindo 700 milhões de pessoas.
Em entrevista coletiva de anúncio do acordo nesta sexta, a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, disse que o “acordo com Mercosul é vitória para Europa”.
“Este é um acordo ganha-ganha, que trará benefícios significativos para consumidores e empresas, de ambos os lados. Estamos focados na justiça e no benefício mútuo”, disse.
“Ouvimos as preocupações de nossos agricultores e agimos de acordo com elas. Este acordo inclui salvaguardas robustas para proteger seus meios de subsistência.”
Desafios na conclusão do acordo
Agricultores europeus, principalmente os franceses, têm se manifestado contra a aprovação do acordo. A França é um dos maiores produtores agrícolas da UE e deve ser bastante prejudicada pelo acordo, já que a América do Sul tem grandes produtores de grãos e alimentos.
Os trabalhadores alegam que haveria uma concorrência desleal, já que, segundo eles, a produção desses alimentos no bloco sul-americano não está submetida aos mesmos requisitos ambientais e sociais, nem às mesmas normas sanitárias em caso de controles defeituosos que a europeia.
Do lado sul-americano, o acordo também divide opiniões. Apesar do potencial de trazer benefícios para os países do Mercosul, a leitura de especialistas é a de que o bloco também pode sofrer com a concorrência vinda da Europa, nos setores industriais, químicos e automobilísticos.
Na quinta-feira (e em diversas outras ocasiões), o presidente francês, Emmanuel Macron, classificou o acordo como “inaceitável” em seu estado atual.
Nesta sexta-feira, a ministra do Comércio da França, Sophie Primas, reafirmou a oposição do país ao acordo comercial entre a UE e o Mercosul, afirmando que o acordo vincula apenas a Comissão Europeia, e não os Estados-membros.
A ministra se comprometeu a resistir às próximas etapas do acordo, citando “preocupações sobre os impactos ambientais e agrícolas”. (Por Isabela Bolzani, g1)
Entenda o acordo negociado entre o Mercosul e a União Europeia
Blocos estão próximos de anunciar tratado de livre comércio entre seus países.
Os países do Mercosul e a Comissão Europeia estão mais próximos de anunciar a conclusão das negociações para um tratado de livre comércio entre os dois blocos.
A expectativa de um desfecho positivo aumentou depois que a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, desembarcou nesta quinta-feira (5/12) em Montevidéu, onde os líderes de Brasil, Argentina, Paraguai, Uruguai e Bolívia realizam a cúpula semestral do Mercosul.
A presença de Von der Leyen é um forte indicativo de que os dois lados pretendem anunciar um entendimento.
Se confirmado, o fato marcará o fim de uma negociação que se arrasta há mais de duas décadas. Depois de vencidas as etapas de implementação, nas quais a oposição liderada pela França deve ressurgir, o tratado deve abarcar um mercado de 750 milhões de pessoas.
ENTENDA OS PRINCIPAIS PONTOS DO ACORDO MERCOSUL – UNIÃO EUROPEIA:
O que é um tratado de livre-comércio?
É um acordo entre países para reduzir ou zerar tarifas e eliminar outras barreiras para importação e exportação. As negociações entre UE e Mercosul foram inicialmente concluídas em 2019, mas o texto foi reaberto.
O que o acordo com a União Europeia prevê?
Para o Mercosul, serão zeradas ou reduzidas as tarifas de exportação para a União Europeia de cerca 90% dos produtos, num prazo que, em 2019, foi estipulado em dez anos.
No caso de itens do Mercosul, o principal foco será sobre produtos agrícolas. O tratado pretende eliminar ou reduzir tarifas para 99% das exportações agrícolas brasileiras, de acordo com estimativa do Ministério da Agricultura.
Para importações de itens vindos da União Europeia, haverá redução de tarifas de carros, peças automotivas, artigos de vestuário, produtos farmacêuticos, chocolates e vinhos.
O acordo também trata de serviços, investimentos, compras governamentais, medidas sanitárias e propriedade intelectual.
Por que o acordo anunciado em 2019 foi renegociado?
As conclusões das negociações ocorreram pela primeira vez em meados de 2019, ainda no governo Jair Bolsonaro (PL). No entanto, houve forte oposição na Europa contra a política e as declarações antiambientais do então líder brasileiro.
Como resultado, o acordo ficou anos na gaveta, sem ser enviado para análise do Parlamento Europeu ou dos Legislativos do países do Mercosul.
Os europeus tentaram ainda negociar um protocolo com compromissos adicionais na área ambiental, mas isso não foi suficiente para fazer as tratativas andarem.
Com a chegada do presidente Lula (PT) ao poder, parte das resistências sobre meio ambiente foi contornada, mas o Mercosul e a UE reabriram as negociações para mudar itens relacionados às exigências ambientais e à política de compras governamentais.
Esse processo se arrastou por praticamente dois anos, até a cúpula do Mercosul de Montevideu que ocorre nesta quinta (5) e sexta-feira (6/12).
O que foi modificado de 2019 para agora?
Ainda não há detalhes oficiais sobre o que foi renegociado. Segundo pessoas a par das conversas disseram à Folha, não houve mudanças significativas nas cotas fixadas para produtos agrícolas entre sul-americanos e europeus. Se confirmado, isso significa que o Mercosul terá uma cota de 99 mil toneladas de carne bovina com tarifa reduzida para o mercado europeu, por exemplo.
Esses interlocutores disseram ainda que foi incluído um dispositivo de reequilíbrio, de caráter dissuasório, com o objetivo de desestimular as partes a adotarem medidas de caráter protecionista.
O Brasil é especialmente preocupado com esse ponto, por temer que a nova lei antidesmatamento da Europa, por exemplo, seja usada para dificultar a entrada de produtos brasileiros na UE.
Segundo esse mecanismo, no caso da adoção de uma ação unilateral vista como protecionista, a outra parte poderá, após várias etapas de consultas, retaliar em até 50% da cota prevista no acordo.
Também deve constar um dispositivo que permite, em último caso, a chamada retaliação cruzada: ou seja, a imposição de tarifas poderá ocorrer em itens diferentes dos que foram supostamente prejudicados por uma medida protecionista.
Outro item que deve estar no tratado é a obrigação de que todos os signatários sejam também membros do Acordo de Paris —uma das razões que deve amarrar o ultraliberal Javier Milei ao compromisso climático.
Quem é a favor e quem é contra?
O acordo é apoiado, em maior ou menor grau, por todos os países do Mercosul. O problema está na Europa, onde o texto rachou o eixo franco-alemão que serve como pilar da UE. Enquanto Alemanha, Espanha, Suécia e Portugal, entre outros, são entusiastas do tratado, há oposição ferrenha na França, que teme principalmente prejuízos para seus agricultores. Recentemente, a Polônia também apresentou objeções, e houve declarações contrárias do governo italiano.
Qual o impacto do acordo para o Brasil?
Em 2019, o Ministério da Economia (hoje Fazenda) estimou que o acordo deve representar um incremento de US$ 87,5 bilhões (R$ 336 bilhões) em 15 anos para o PIB (Produto Interno Bruto) brasileiro, podendo chegar a US$ 125 bilhões (R$ 480 bilhões).
Qual o tamanho dos mercados?
O Mercosul e a UE representam, somados, PIB de mais de US$ 20 trilhões e um mercado de 750 milhões de pessoas.
Quanto movimenta o comércio entre os blocos?
Em 2023, a UE exportou para os quatro membros do Mercosul (Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai) cerca de 55,7 bilhões de euros.
Na direção contrária, o Mercosul vendeu para a União Europeia 53,7 bilhões de euros.
A Bolívia só ingressou recentemente no Mercosul.
Quais setores brasileiros são beneficiados?
Devem se beneficiar principalmente produtos agrícolas, peixes, crustáceos e carnes bovina, suína e de aves, entre outros setores.
Quais setores da economia brasileira podem ser prejudicados?
Produtores de itens que o Brasil importa da UE, como vinhos, veículos, máquinas, produtos farmacêuticos e químicos, podem enfrentar maior competição.
Quais obstáculos o acordo ainda enfrentará?
Depois da conclusão das negociações, ele precisa ser analisado pelo Parlamento Europeu e pelos Legislativos dos países do Mercosul.
Deve também ser assinado pelos executivos dos países (no caso da UE, pela Comissão Europeia e por outros órgãos europeus).
Depois, a implementação do acordo ainda depende de aval dos Parlamentos de todos os países da União Europeia.
Há ainda a possibilidade que a Comissão Europeia tente fatiar a implementação do acordo, para que ele entre em vigor mais rapidamente. Nesse caso, a parte comercial poderia ser implementada a partir da aprovação no Parlamento Europeu, enquanto os capítulos políticos tomariam o caminho mais longo e precisariam esperar a luz verde dos Legislativos nacionais europeias (Folha)
No acordo dos blocos, Mercosul tem volume e UE, valor
Brasil ganha com retirada de tarifa e União Europeia com fornecimento de insumos.
“Nunca estivemos tão perto”. Essa é a frase que participantes das negociações do acordo Mercosul-União Europeia vêm ouvindo ao longo dessa complexa caminhada que já dura mais de duas décadas. Desta vez, parece que está mais próximo do que nunca o desfecho.
Olhando apenas do lado do agronegócio, a assinatura é importante para o Brasil, uma vez que o país não tem nenhum acordo relevante até agora. Sem eles, o Mercosul sempre negocia em desvantagem.
O cerne das negociações foi definido em 2019, mas a União Europeia colocou novas exigências, como a side letter e a lei antidesmatamento no caminho.
Esta última, que acabou sendo adiada por um ano, coloca barreiras ambientais em sete produtos brasileiros. Eles somaram US$ 9,5 bilhões nas exportações de janeiro a novembro deste ano para a União Europeia, 40% do valor dos produtos relacionados ao agronegócio que foram enviados para o bloco no mesmo período. Essas novas exigências europeias colocam mais ônus nas exportações do Mercosul.
O acordo é um passo bom para os dois lados, segundo Sueme Mori, diretora de Relações Internacionais da CNA (Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil). Para ela, o Brasil tem um mercado agropecuário forte e centrado dentro da porteira.
Já os europeus devem explorar produtos com maior valor agregado, como vinhos, lácteos, azeite de oliva, entre outros. É preciso olhar não para o volume, mas para o valor das exportações dos europeus, afirma a diretora da CNA.
“É um erro dizer que a União Europeia não é um mercado importante. Ele é o segundo maior destino das exportações brasileiras.
E, em muitos produtos, como café, frutas e farelo de soja, é o primeiro”, diz Sueme.
Além de abrir novas possibilidades com tarifas reduzidas, o mercado europeu pode ser uma vitrine para novos acordos do Brasil e do Mercosul, devido às exigências europeias nas importações.
O tamanho do agronegócio brasileiro também abre novas portas para os europeus. Quanto mais o país expandir a produção nacional, maior será a demanda por insumos, setor que o bloco é grande fornecedor.
“Químicos, máquinas agrícolas, serviços e outros insumos se tornam um grande mercado para as indústrias europeias atreladas ao agronegócio e que exportam ou atuam por aqui”. Isso também afeta indústria do bloco europeu de uma forma geral, setor, inclusive, que sempre quis uma aceleração do acordo, afirma a diretora da CNA.
Essas negociações são muito vistas do ponto comercial, mas há outros capítulos envolvidos nelas, como investimentos e compras governamentais, o que leva o acordo para outro nível, afirma.
Segundo Sueme, do ponto de vista brasileiro, tudo que tem tarifa na União Europeia favorece o país, devido à redução ou à eliminação. Alguns produtos têm redução de tarifa, mas com cota limite, como a carne bovina. Outros zeram ou têm reduzidas as tarifas ao longo dos anos. Em alguns, como o da maçã fresca, o prazo é de até dez anos. Suco de laranja e cachaça terão um sistema misto.
Estudo de avaliação apresentado no Senado indicou que, sem o acordo, 24% das exportações brasileiras estão livres de tarifas no mercado da União Europeia. Com o acordo, esse percentual sobe para 92% (Folha)
Quais as vantagens ao agro brasileiro no acordo entre Mercosul e UE?
Para sócio-diretor da Agroicone, facilidade de acesso ao bloco econômico é mais importante do que volumes de negócios.
As negociações para o acordo Mercosul-União Europeia já duram mais de duas décadas. No entanto, agora, existem claros sinais de que o tratado comercial entre os blocos, que prevê redução de tarifas comerciais e acesso privilegiado de commodities entre os países dos dois continentes, está prestes a ser assinado.
Isso porque a presidente da Comissão Europeia, Ursula Von der Leyen, chegou em Montevidéu, no Uruguai, nesta quinta-feira (5/12), onde participará de reunião que deve anunciar a conclusão do tratado comercial entre as duas regiões.
De acordo com o sócio-diretor da Agroicone Rodrigo Lima, é importante lembrar que em acordos comerciais entre países, há sempre o ganhar e perder, visto que as nações precisam abrir concessões.
“A agropecuária do Mercosul, por exemplo, conquistou algumas cotas preferenciais de acesso ao mercado europeu. Em relação à carne bovina, essa cota é de 99 mil toneladas, sendo o Brasil responsável por 28.5 mil toneladas dessa cota”, afirma.
Lima lembra que esse volume, diante das 2,2 milhões de toneladas da proteína animal que o Brasil embarcou ao mundo em 2023, é irrelevante. “Contudo, se trata de acesso preferencial ao mercado europeu, de carne de alta qualidade, ou seja, não é necessariamente o volume ou o valor de carne que servirá como grande diferencial para as exportações agrícolas brasileiras, mas sim o acesso facilitado e preferencial a esse mercado”.
Além disso, o sócio-diretor da Agroicone destaca que a relação direta com os europeus servirá, também, para a solução de eventuais problemas sanitários, fitossanitários e ambientais entre as partes, estabelecendo um canal de negociações direto sem a necessidade de intermediação da Organização Mundial do Comércio (OMC) (Canal Rural)