Paulo Skaf foi eleito, nesta segunda-feira, 4/8, para presidir a Fiesp a partir de janeiro de 2026; empresário concedeu entrevista exclusiva à Coluna do Estadão.
Gestos do governo Lula provocaram os Estados Unidos e geraram tarifaço de Trump, diz Skaf.
O empresário Paulo Skaf foi eleito nesta segunda-feira, 4/8, para presidir a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) a partir de janeiro de 2026. Disputou em chapa única e venceu com 99 votos sim e um branco. Em entrevista exclusiva, ele atribui ao governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) atitudes que fizeram o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, taxar os produtos do Brasil em 50%. A nova alíquota começa a valer na quarta-feira, dia 6.
“Na minha opinião, o governo brasileiro, neste momento, fez certas opções que não foram convenientes ao Brasil”, afirma à Coluna do Estadão.
Skaf lista, entre outros pontos, a reunião dos Brics no fim de junho e o discurso de desdolarização de Lula. “Todos esses gestos, todas essas ações, elas provocam o nosso principal cliente de manufaturas, que são os Estados Unidos. Eu não entendo que seja uma boa política; nós provocamos, nós não estarmos bem com os Estados Unidos por várias razões”, afirma.
Para ele, a saída para o tarifaço é um reforço na diplomacia brasileira. Ele mostra ceticismo com o plano de socorro prometido pelo governo Lula às empresas afetadas pelo tarifaço. “O melhor socorro é o governo brasileiro ter uma atitude, ter gestos que realmente possam fazer com que os Estados Unidos recuem dessa decisão. Eu espero que o presidente Lula tenha sucesso no
Nesta entrevista, Paulo Skaf evita entrar na discussão sobre o avanço dos Estados Unidos sobre a soberania brasileira. Indagado sobre as críticas do empresariado à postura inicial do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), em apoio a Trump, afirmou não ter visto o governador defender o tarifaço. O presidente eleito da Fiesp também evitou avaliar se o atual presidente da federação, Josué Gomes, erra ou demora por não colocar a instituição diretamente nas tratativas com representantes dos Estados Unidos para evitar a super taxação, a partir desta quarta-feira, 6.
O futuro presidente da Fiesp toma posse em 1º de janeiro de 2026. Até lá, diz que estará à disposição da instituição para ajudar a intermediar conversas do empresariado com os Estados Unidos. E, a partir do ano que vem, pretende estabelecer um Conselho global na Fiesp para tratar das relações com outros países.
O sr. é eleito às vésperas de o Brasil enfrentar o tarifaço do governo Trump. Qual deve ser o papel da Fiesp neste momento e de que forma o sr. pretende se envolver nessa discussão?
Nós temos uma certa urgência para essas providências do tarifaço. Então, eu espero, e vou fazer tudo como presidente eleito para que a Fiesp se envolva e ajude as empresas de todas as formas. Apoiando a diplomacia oficial, apoiando todos aqueles que estiverem envolvidos num tema para tirar essa alta tarifa de 50%.
A grande preocupação é que grande parte desses que estão taxados em 50% são setores com predominância de pequenas e médias empresas, que têm mais dificuldade de eles próprios se resolverem com seus parceiros americanos.
44% de setores importantes, graças a Deus, conseguiram resolver (ou seja, foram incluídos da lista de exceções), graças ao trabalho deles, junto com as empresas americanas, setores que haviam prioridade nos Estados Unidos. O problema diminuiu, mas não ficou resolvido; pelo contrário. Temos aí um desafio muito grande, e tudo que puder ser feito para ajudar a solucionar, nós vamos de estar à disposição.
O sr. pretende bater à porta do governo americano para tentar negociar, a exemplo do que fizeram alguns empresários, um dos exemplos foi o caso da Embraer?
Embora o meu mandato inicie a partir de 1º de janeiro, eu vou estar à disposição dos setores produtivos. No momento que for possível que eu tenha um papel e ajude a solucionar esse problema ou até encontrarmos os caminhos alternativos, eu vou estar à inteira disposição. Mas, para o ano que vem, eu pretendo fazer um trabalho de forma permanente que vou chamar de diplomacia empresarial. Nós não podemos esperar as situações já críticas para correr atrás dos nossos parceiros e dos governos, como está acontecendo agora. Nós temos que nos isolar das tempestades políticas.
Essa diplomacia empresarial vai significar um trabalho permanente de empresas, no caso dos Estados Unidos, que eu pretendo fazer isso com outros mercados também, mas prioritariamente com os Estados Unidos. Empresas brasileiras, empresas americanas, a Fiesp ajudar esse entrosamento, identificando mercados, dificuldades recíprocas, ajudando nos contatos com os dois governos.
E, nesse sentido, um dos nossos conselhos, que é o Conselho de Relações Internacionais, eu farei esse conselho global e o presidente desse será o embaixador Roberto Azevedo, que foi ex-presidente da OMC (Organização Mundial do Comércio).
A Fiesp erra ou demora em procurar diretamente os Estados Unidos neste momento?
Neste momento eu não quero falar em nome da Fiesp. A Fiesp tem seu presidente, sua diretoria, e cabe a eles tomar as decisões, as iniciativas. A partir de 1º de janeiro do ano que vem, aí sim eu vou dar disposição para falar em nome da Fiesp.
Como trabalhar com o presidente Lula para amenizar uma situação como essa do tarifaço, já que isso pede união de setor privado e governo, e a gente sabe que o sr. e Lula sempre foram adversários no campo político?
Você sabe que, neste momento, eu não tenho nenhuma ligação política partidária. E, assumindo a Fiesp a partir de 1º de janeiro do ano que vem, naturalmente eu sempre vou respeitar os governantes que estiverem nos seus cargos.
Quando os políticos ou governantes estiverem certos, a Fiesp deve apoiar e aplaudir. Quando estiverem errados – quando eu falo errado, é errado no sentido de não estarem agindo da melhor forma para o Brasil, no interesse da nação brasileira -, a Fiesp deve ter independência em tomar as providências e ter as reações necessárias. Então, o relacionamento vai ser dessa forma.
Como o sr. avalia a relação do governo Lula com os EUA?
Na minha opinião, o governo brasileiro, nesse momento fez certas opções que não foram convenientes ao Brasil. No momento em que o governo brasileiro permite navios iranianos atracarem no porto do Rio de Janeiro. Não sei para que o vice-presidente do Brasil esteve na posse do presidente do Irã. Também não entendi muito o presidente Lula estar na Praça Vermelha por comemorações do Dia da Vitória. E, depois de tudo isso, ainda numa reunião dos Brics, o presidente do Lula vai discursar pela desdolarização. Ou seja, todos esses gestos, todas essas ações, elas provocam o nosso principal cliente de manufaturas, que é os Estados Unidos. Eu não entendo que seja uma boa política, nós provocamos, nós não estarmos bem com os Estados Unidos, por várias razões.
Trump vem adotando tarifas em vários locais do mundo; mas no caso do Brasil, ele incluiu um fator político. É uma forma de ultrapassar e afetar a soberania brasileira?
A minha leitura é que os Estados Unidos colocaram sobretaxas na maior parte dos países que tinham grandes superávits comerciais, que não é o caso do Brasil. Eu acho que o caso do discurso de desdolarização, depois daquela reunião dos Brics, o Trump declarou que ameaçou taxar em 100% os países que participavam dos Brics. Então, nós temos que enxergar isso com clareza e tomarmos essa cautela para essa situação se acalmar.
Eu espero que o presidente Lula tenha sucesso no contato com o presidente Trump, eu espero que os nossos governos se entendam. Agora, é fundamental que se acalme essa situação. É importante que o presidente Lula trate o assunto com os Estados Unidos lembrando que se trata de um país parceiro do Brasil.
O governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, foi muito criticado pelo próprio empresariado aqui no Estado no momento em que defendeu inicialmente esse tarifaço. O governador errou?
Olha, eu não vi o Tarcísio defender o tarifaço. Até porque ninguém pode defender qualquer medida que possa onerar empresas brasileiras. Eu acho que ninguém acha bom o tarifaço. Mas o que nós precisamos é ver as razões para que realmente se evite que aconteça e se resolva o problema.
Qual cenário o sr. traça sobre desemprego no setor industrial, de produção? O governador Tarcísio chegou a mencionar a possibilidade de 44 mil a 120 mil empregos a menos no Estado e uma perda de 3 a 7 bilhões na massa salarial. Vocês já fazem alguma projeção?
O que acontece é o seguinte: nós exportamos em torno de US$ 40 bilhões para os Estados Unidos – 46% disso ficaram fora do tarifaço. Então, voltaram para os 10% (de tarifa). Isso significa que, teoricamente, US$ 20 bilhões ficaram preservados. Dos outros US$ 20 bilhões, a grande dúvida é quanto vai reduzir devido à tarifa de 50% – ainda com a esperança de que a gente consiga reduzir com a negociação. Mas, supondo que fique do jeito que está, você pode ter uma situação que cai pela metade ou até mais esses outros US$ 20 bilhões.
Então, vamos imaginar que esses outros virem US$ 10 bilhões. Então, os US$ 40 bilhões viram US$ 30 bilhões. Então, isso significaria uma queda de uns 25%. Se isso ocorrer desta forma, isso pode representar, em termos de Brasil, uns 100 mil empregos e isso afetaria 0,5% do PIB.
O ministro Fernando Haddad diz que apresentará um plano de socorro. Na sua avaliação, o que é preciso ter de todo jeito nesse plano e o que não poderia ter de jeito nenhum?
Eu acho que o primeiro ponto é tentar resolver com os Estados Unidos, tentar recuperar e ajustar essas relações dos nossos países para tentar eliminar esse tarifaço. O melhor socorro é o governo brasileiro ter uma atitude, ter gestos que realmente possam fazer com que os Estados Unidos recuem dessa decisão. Permanecendo essa decisão, o esforço empresarial está tendo e vai ter.
Mas alguns setores, principalmente as pequenas e médias empresas que estão mais afetadas, naturalmente uma linha de capital de giro a custos razoáveis, toda ajuda que possa ser dada para essas empresas para que elas tenham tempo até reconduzir, redirecionar esses produtos a outros mercados, o consumo interno, enfim, buscarem em caminhos que não são fáceis. É meio imprevisível porque eu não deixaria de ter a esperança ainda de se construir uma relação com os Estados Unidos no curtíssimo prazo para que a gente saia dessa situação de 50% de imposto sobre alguns produtos. Não justifica os Estados Unidos manterem essa medida contra nós.
Mas uma nova política de subsídio gera problemas nas contas públicas.
É, mas nós estamos falando de alguma coisa muito pontual para os brasileiros, um socorro para alguns segmentos, para pequenas e médias empresas, se necessário. Se persistir esta alíquota e se empresas não conseguirem, na velocidade necessária, encontrar novos caminhos, naturalmente, o ministro da Fazenda está para anunciar alguns apoios e são apoios pontuais e temporários. Não é nada que represente muito. Mas, considerando o acidente de percurso de certa forma, talvez até motivada por atitudes do próprio governo brasileiro que acabou gerando essa situação, eu acho que não dá para abandonar essas empresas (Estadão)







