- Além das tarifas de Trump sobre café brasileiro, mudanças climáticas também afetam mercado
- Preços futuros do arábica, variedade mais cultivada no Brasil, subiram quase 40% desde agosto
Americanos estão pagando mais caro por uma xícara de café desde que os Estados Unidos impuseram, em julho, uma tarifa de 50% sobre o produto vindo do Brasil, o maior produtor mundial.
Nesta semana, os preços voltaram a disparar no mercado futuro à medida que os estoques de grãos brasileiros nos EUA caíram ao nível mais baixo desde 2020 e o presidente Donald Trump ameaçou aplicar tarifas também sobre a Colômbia, outro grande exportador.
Mas a guerra comercial do presidente americano mascara outro fator importante por trás da alta: as mudanças climáticas.
As regiões produtoras de café no Brasil vêm enfrentando uma seca intensa. No último mês, partes de Minas Gerais registraram cerca de 70% da média histórica de chuvas para o período. Na semana passada, o volume foi inferior à metade do normal, segundo análise meteorológica da Bloomberg Brasil.
“Há ainda a questão climática”, disse Fernando Maximiliano, gerente de inteligência de mercado de café da StoneX. “Essas tarifas são uma camada adicional, mas não podemos ignorar o fator estrutural principal, que é a oferta mais restrita.”
Desde agosto, os preços futuros do arábica —variedade de café mais cultivada no Brasil— subiram quase 40% e se aproximam de níveis recordes. Os preços do robusta, usado sobretudo em cafés instantâneos, aumentaram cerca de 37%.
O Brasil responde por quase 40% da produção global de café. O país vem sofrendo com secas anuais desde 2020, o que fez a demanda mundial superar a oferta, segundo analistas. Maximiliano prevê que o equilíbrio só virá não por aumento da produção, mas porque os consumidores estão reduzindo o consumo diante dos preços elevados.
A Conab afirmou esperar que as chuvas recentes atenuem o estresse das plantas causado pela estiagem anterior. E, no início deste mês, Trump e o presidente Luiz Inácio Lula da Silva iniciaram conversas para retirar as tarifas sobre produtos brasileiros. Um acordo poderia baratear o café para os consumidores americanos à medida que as importações reabastecem os estoques nos EUA.
No longo prazo, porém, os preços devem continuar subindo com o aumento das temperaturas. Estudos indicam que, devido às mudanças climáticas, apenas cerca de 50% das atuais áreas de cultivo serão adequadas para a produção de café em 2050.
Países produtores já se preparam para o futuro. Pesquisadores brasileiros estão mapeando novas zonas de cultivo com temperaturas mais amenas e disponibilidade de chuvas ou irrigação. Brasil e Uganda, entre outros, buscam proteger as plantas do calor e da seca, além de investir em clonagem para desenvolver cultivares mais resistentes.
“O Brasil é um país muito rico”, disse Kleber Santos, auditor fiscal do Ministério da Agricultura. “Nossa grande vantagem é que, dentro do próprio território, conseguimos encontrar condições diferenciadas e adequadas ao café.”
Nesta quinta-feira (23), os contratos futuros do café atingiram novos recordes em Nova York. Os preços do arábica, que geralmente alcança os maiores preços, subiram até 4,1%, para US$ 4,3795 a libra-peso.
O arábica, que alcança os maiores preços, é mais sensível às variações climáticas que o robusta, capaz de tolerar temperaturas mais altas. De toda forma, o cultivo do café depende de chuvas regulares. Andrea Illy, presidente da italiana IllyCaffè, estima que menos de 10% das plantações no mundo sejam irrigadas. Para acompanhar as tendências atuais de clima e demanda, ele projeta que esse percentual precise subir para um terço.
Essas e outras adaptações para tornar o café mais resiliente devem encarecer ainda mais o produto, com investimentos em novas técnicas de cultivo, fertilizantes e métodos aprimorados de colheita.
“Se o clima está mudando, precisamos entender isso e nos adaptar”, disse Daniel El Chami, diretor de estratégia sustentável da TIMAC AGRO International, que oferece soluções tecnológicas para a agricultura sustentável. “Não dá para continuar criando novas demandas e novos materiais de consumo como se o clima não existisse.” (Bloomberg)




