Por Lucien Belmonte
A glória do passado, ungida em petróleo, não garante mais a paz no futuro de forma sustentável e renovável como tanto almejamos
“Gigante pela própria natureza.” Assim o hino nacional descreve o Brasil. O verso decassílabo já foi citado pelo ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, para exaltar o potencial energético nacional, mas da maneira como as coisas andam no Brasil, o futuro não espelhará tanta grandeza.
“Deitada eternamente em berço esplêndido” está a Petrobras. Diagnóstico recente da Empresa de Pesquisa Energética (EPE) indica que o custo de US$ 2,50 por milhão de BTU que a petroleira tem na boca do poço vira US$ 10,50 ao entrar no gasoduto de transporte e chega ao consumidor final custando entre US$ 14 e US$ 16, uma captura de recursos que lesa o resto da economia. Nos Estados Unidos e no Canadá, o preço não passa de US$ 3 por milhão de BTU. Na Argentina, chega no máximo a US$ 6. Ter a Petrobras era para ser uma grande vantagem competitiva para o País, mas não é.
Cerca de R$ 15 bilhões ao ano são tirados da indústria nacional por conta dessa política de preços equivocada. Apesar dos esforços dos últimos tempos, podemos ainda enfrentar um problema de direito da concorrência diante do potencial abuso de posição dominante da estatal.
A Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) não parece ter condições de evitar os eventuais excessos da petroleira. O Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) não tem tocado no problema da maneira incisiva como a indústria espera. O Conselho Administrativo de Defesa da Concorrência (Cade), até o momento, não se debruçou sobre tais circunstâncias.
Campanhas publicitárias tentam posicionar a Petrobras como líder na mudança da matriz energética brasileira, mas a conduta comercial da empresa vai na direção contrária. Sobra propaganda e falta visão de país e de futuro.
Um ativo desse porte, que os brasileiros tanto defenderam, não é um fim em si.
Não é a Nação que deve “orbitar o Edise”. A Petrobras precisa se compreender como vetor da transição energética nacional, como diferencial competitivo que agregue valor ao setor produtivo e ajude o País a crescer, não o inverso.
Finalmente temos um diagnóstico claro do que deve ser feito. Só falta coragem regulatória para resolver o problema e deixar a indústria voltar a acontecer neste país. A Petrobras deve ajudar a viabilizar uma transição energética justa e efetiva e contribuir para que a energia seja mais barata para os brasileiros. A glória do passado, ungida em petróleo, não garante mais a paz no futuro de forma sustentável e renovável como tanto almejamos (Lucien Belmonte é presidente-executivo da Associação Brasileira das Indústrias de Vidro (Abividro), coordenador do Fórum do Gás, é porta-voz do movimento União pela Energia; Estadão)