Clima e preços baixos fazem produtor buscar novas culturas para plantio

Gergelim, planta que exige menos água, foi uma das que mais cresceram na safra.

Os anos recentes foram de demanda mundial acelerada, safras recordes no Brasil, preços elevados das commodities e custo baixo de produção. Foi um período de vacas gordas e de boa renda.

Clima adverso, demanda mais contida, aumento nos custos de produção e contas a pagar que sobraram dos anos recentes trazem, agora, outra realidade para o setor.

É nesse contexto de incertezas climáticas e perspectivas de renda menor que parte dos agricultores buscam novas oportunidades com o aumento da produção de gergelim, canola, sorgo, girassol, amendoim e até com a esquecida mamona.

Ainda é pouco, mas a produção dessas culturas secundárias já somam 8,1 milhões de toneladas, 10% a mais do que na safra anterior, conforme os dados mais recentes da Conab (Companhia Nacional do Abastecimento).

O produtor busca uma diversidade para não ficar refém apenas das culturas tradicionais, principalmente na segunda safra do ano, segundo Fabiano Vasconcellos, gerente de acompanhamento de safras da Conab. Frustrações com clima e renda levam o produtor a essa busca, afirma ele.

Endrigo Dalcin, produtor de Mato Grosso e ex-presidente da Aprosoja-MT, diz que novos usos para os produtos agrícolas geram demandas para novas culturas, além das tradicionais. Gergelim, canola, sorgo e até a soja convencional ganham espaço.

Os dados da Conab, referentes à safra 2023/24, indicam aumento de 82% na área de gergelim e elevação de 91% no volume produzido no período. A área cultivada subiu para 656 mil hectares. O produto ganha espaço no Centro-Oeste, principalmente em Mato Grosso, onde a área cresce 127%, e a produção, 134%.

Dalcin, que também fez opção pelo gergelim, diz que o produto encaixou como uma luva. “É uma planta mais rústica, exige menos água e proporciona uma rentabilidade superior à das outras culturas. O gasto é muito pequeno, principalmente se o produtor tem a semente em casa.”

Entram nessa conta o diesel e herbicida para o controle de ervas daninhas, uma vez que a planta ainda não tem muitas doenças e pragas.

Quem consegue uma boa produtividade tem boa rentabilidade. Com custos de produção próximos de R$ 500 por hectare, no pico dos preços, quando estava a R$ 5,8 por quilo, a rentabilidade chegou a R$ 5.000 por hectare, um valor não registrado por nenhuma das plantas tradicionais da região, diz o produtor.

Mas nem tudo são vantagens, alerta. O gergelim não deixa palhada após a colheita, essencial para a fertilidade do dolo. O produto, quando no período de safra é muito sensível a vento, e a colheita precisa ser feita com muito cuidado para evitar perdas.

Com a rentabilidade baixa da soja e do milho, Dalcin acredita que o plantio poderá aumentar ainda mais na próxima safra. O problema é que ainda não há uma tecnologia definida para o cultivo do gergelim, mas a Embrapa está desenvolvendo cultivares mais produtivas, afirma o produtor.

Falta também uma abertura maior dos mercados externos. Índia, países do Oriente Médio e República Dominicana são importadores, mas é prioritária a abertura do mercado chinês.

Ex-presidente da Aprosoja e conhecedor do mercado brasileiro, Dalcin afirma que o produtor precisa buscar novas oportunidades. O mercado mundial de soja, do qual o Brasil é líder, está com produção crescendo acima da demanda.

Além disso, o Brasil olhou muito para o crescimento da produtividade da soja e não para o teor de proteína e qualidade do óleo. O país tem de ficar atento a esses detalhes porque os chineses, maiores importadores, já começam a exigir uma soja de melhor qualidade.

O sorgo também ganha uma atenção especial por parte dos produtores. Uma cultura pouco explorada até então, deverá atingir 5 milhões de toneladas neste ano. Com tolerância maior a déficit hídrico, e após frustrações dos produtores com o milho safrinha, o sorgo ganha espaço na segunda safra, diz Vasconcellos.

Para o gerente de acompanhamento de safras da Conab, há uma mudança de comportamento do produtor com relação ao sorgo, antes semeado apenas quando era perdida a janela ideal de plantio do milho.

O sorgo deixou de ser uma cultura de “oportunidade só quando o milho não ia bem” e chega a substituir o cereal mesmo em janelas ideais de plantio, segundo o gerente da Conab.

O aumento de produção permitiu ao Brasil exportar o recorde de 59 mil toneladas de sorgo no primeiro semestre deste ano, um volume, porém, bem inferior às 400 mil toneladas dos Estados Unidos. O Brasil pode avançar nas exportações do produto, principalmente para a China.

O aproveitamento de cereais e de oleaginosas para novas fontes de energia abre campo também para uma diversificação maior de cultivos pelo produtor. A canola é uma das opções. Há um incentivo da cultura para a produção de diesel verde, segundo Dalcin.

O produtor destaca ainda a possibilidade de evolução da produção brasileira de pulses (ervilha, grão de bico e outros). A Embrapa tem papel preponderante nessa evolução. Só o mercado indiano poderá absorver próximo de 30 milhões de toneladas desses produtos, afirma.

Até a mamona, com crescimento de 15% na área nesta safra, ganha novos olhares. Após recuo de plantio nos anos recentes, ela ganha investimentos na Bahia, principal produtora nacional, e áreas de experimentos em outros estados, afirma Vasconcellos

Dalcin diz que o Brasil precisa buscar novas saídas. Para ele, a conta da demanda de soja não fecha com a da oferta, quando se soma os 170 milhões de toneladas do Brasil, os 120 milhões dos Estados Unidos e os 51 milhões da Argentina, isso para ficar apenas nos três principais produtores. Haverá muita soja no mercado (Folha)

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