Por Max Bearak, The New York Times
- Volume da produção chinesa fez preços das tecnologias de energia limpa caírem entre 60% e 90%
- Empresas do país asiático fornecem 80% dos painéis solares e 60% das turbinas eólicas no mundo
Desde o início da era industrial, a economia global tem exigido cada vez mais combustíveis fósseis como carvão, petróleo e gás, para sustentar o crescimento.
No entanto, está cada vez mais claro que os esforços da China para vender baterias, painéis solares e turbinas eólicas ao mundo estão prestes a encerrar essa era, segundo um novo relatório.
O domínio chinês nas indústrias de energia limpa está “criando as condições para uma queda no uso de combustíveis fósseis”, de acordo com o relatório da Ember, um grupo de pesquisa focado nas perspectivas das tecnologias de energia limpa.
O relatório inclui um vasto conjunto de dados para sustentar essa afirmação.
A escala da produção chinesa desde 2010 fez com que os preços dessas tecnologias caíssem entre 60% e 90%, segundo os pesquisadores.
No ano passado, mais de 90% dos projetos de energia solar e eólica no mundo geraram eletricidade mais barata do que a alternativa fóssil mais barata disponível, segundo o texto. Essa vantagem de custo poderia parecer absurda antes de a China começar a investir bilhões de dólares em subsídios para o setor.
“A China é o motor”, disse Richard Black, autor do relatório. “E está mudando o cenário energético não apenas internamente, mas em países ao redor do mundo.”
Se Pequim está tentando tomar para si o futuro da energia, o principal concorrente seria os Estados Unidos, maior produtor e exportador mundial de petróleo e gás. O governo Trump eliminou quase todo o apoio federal às energias renováveis e pressionou países a comprarem combustíveis fósseis americanos como parte de acordos comerciais.
A queda nos custos da energia renovável, no entanto, significa que muitos países, especialmente os mais pobres, têm um forte incentivo para reduzir sua dependência dos combustíveis fósseis.
Segundo o relatório da Ember, os custos decrescentes da energia gerada por instalações solares e eólicas fabricadas na China permitiram que países como México, Bangladesh e Malásia ultrapassassem os Estados Unidos nos últimos anos em termos de uso de eletricidade renovável (em vez de combustíveis fósseis) em atividades cotidianas como aquecimento e refrigeração de edifícios ou abastecimento de veículos.
Em toda a África, as importações de painéis solares da China aumentaram 60% nos últimos 12 meses, e 20 países africanos importaram uma quantidade recorde nesse período, segundo um estudo separado da Ember.
As empresas americanas, que não fabricam painéis solares ou turbinas eólicas em escala comparável à das chinesas, estão em grande desvantagem. As empresas chinesas agora fornecem 80% dos painéis solares e 60% das turbinas eólicas no mundo, segundo a Ember.
A China busca dominar a energia renovável tanto por razões econômicas quanto para proteger sua segurança nacional, reduzindo sua dependência de importações de petróleo, mas as implicações para a saúde do planeta são imensas.
O consenso científico há muito tempo aponta que uma queda acentuada no uso de combustíveis fósseis é a maneira mais eficaz de desacelerar as mudanças climáticas.
“Por muito tempo, as economias emergentes enfrentaram o que parecia ser um dilema entre crescimento e sustentabilidade”, disse Suwit Khunkitti, ex-vice-primeiro-ministro da Tailândia. O relatório da Ember “desafia essa suposição”, afirmou.
É claro que alguns países podem não querer depender tanto da tecnologia chinesa por razões geopolíticas e poucos países em desenvolvimento têm capacidade de investimento para instalar os sistemas de transmissão e armazenamento de energia que permitiram à China transformar sua própria rede elétrica tão rapidamente.
O momento em que o uso global de combustíveis fósseis atingirá o pico também depende da velocidade dessa transformação dentro da própria China.
A China ainda queima mais carvão do que o resto do mundo combinado e emite mais poluição climática do que os Estados Unidos e a Europa juntos. O país não viu uma queda geral no uso de carvão, embora suas emissões totais de gases de efeito estufa pareçam ter atingido um platô.
Porém, no ano passado, a China atendeu 84% do crescimento da demanda por eletricidade com energia solar e eólica, segundo o relatório. Isso permitiu uma redução de 2% no uso de combustíveis fósseis, apesar do aumento na demanda por energia.
Richard Black disse que essa queda no uso de combustíveis fósseis se deve, principalmente, à redução na queima de carvão para gerar eletricidade. Ele apontou várias diretrizes políticas recentes que realocaram subsídios e incentivos de produção do carvão para a energia solar e eólica.
A China ainda está construindo dezenas de novas usinas termelétricas a carvão, disse ele, mas em vez de funcionarem constantemente como muitas das existentes, elas podem operar em capacidade máxima apenas durante picos de demanda energética. Enquanto isso, a contribuição da energia solar e eólica para a rede está crescendo rapidamente, afirmou.
“O carvão está cada vez mais atuando como rodinhas de apoio”, disse Yuan Jiahai, professor da Universidade de Energia Elétrica do Norte da China. “Ele fornece equilíbrio e suporte enquanto o sistema de eletricidade limpa ganha força e confiança.”
A economia chinesa como um todo está cada vez mais dependente do setor de energia limpa.
Investimentos e produção no setor contribuíram com quase US$ 2 trilhões (cerca de R$ 10,8 trilhões) para a economia chinesa no ano passado, valor que representa cerca de um décimo da economia total do país, ou o equivalente à economia inteira da Austrália.
O setor de energia limpa cresceu a uma taxa três vezes maior do que a economia chinesa como um todo, segundo o relatório (The New York Times)