Brasil pode enriquecer com energia renovável para IA

Por Ronaldo Lemos

Sozinhos, os datacenters irão consumir 4,5% da energia no planeta até 2030.

Existe um caminho para o Brasil participar diretamente na geração de riqueza que a inteligência artificial está provocando: a eletricidade. Especificamente, a energia renovável. O mundo assistiu estarrecido nos últimos meses à valorização das ações da Nvidia, empresa que fabrica os chips usados pelas empresas de IA. O valor da empresa aumentou US$ 2,7 trilhões em 18 meses, valor maior que o PIB (Produto Interno Bruto) do Brasil em 2023.

A razão é que a inteligência artificial tem dois pilares: chips e eletricidade. IA sem chip não existe. E chip sem eletricidade é uma pedrinha inútil. Em 2023 a Nvidia despachou 100 mil unidades deles, que consomem 7,3 TWh. A expectativa é de crescimento exponencial desse número até 2026, com aumento de ao menos dez vezes na demanda por eletricidade só para abastecer os chips da Nvidia.

Essa tendência já está se concretizando. O Google acabou de publicar seu relatório anual de impacto climático. A empresa aumentou em 48% suas emissões de gases de efeito estufa nos últimos 5 anos; 13% só em 2023, totalizando 14,3 milhões de toneladas anuais. A causa é justamente o consumo de energia nos datacenters de inteligência artificial.

Números como esses são intoleráveis. Emporcalhar ainda mais a atmosfera para alimentar serviços de inteligência artificial revolta o senso comum. Especialmente porque, sozinhos, os datacenters irão consumir 4,5% da energia no planeta até 2030.

É nesse contexto que a demanda por energia renovável aumentará exponencialmente, tal como os chips da Nvidia. O Brasil é o país mais bem posicionado do mundo para atender a isso. Em 2023, 93,1% da energia produzida aqui originou-se de fontes renováveis (dados da CCEE, Câmara de Comercialização de Energia Elétrica). Temos 203 GW de potência instalada e 85 GW em projetos de geração futura, sendo 100% deles renováveis (dados da Aneel, Agência Nacional de Energia Elétrica).

Podemos atrair datacenters para o Brasil, fornecendo essa energia localmente (powershoring). Ou essa energia pode ser exportada, alimentando cargas em outros continentes. O caminho para isso é acelerar o Programa Nacional de Hidrogênio (PNH2), que usa a energia renovável para fabricar hidrogênio, que pode então ser exportado.

O Senado aprovou na última quarta o projeto de lei 2.038, que cria o marco legal do hidrogênio no país. Essa é, de longe, a principal lei sobre inteligência artificial do país (e quiçá do mundo!). É a lei que importa, que abre o caminho para o país atuar em uma questão estrutural da IA.

É o primeiro passo para nos beneficiarmos diretamente da expansão da IA, fornecendo energia limpa. Podemos virar uma “Nvidia” da eletricidade limpa. Mas para isso é preciso agir rápida e estrategicamente.

A peça-chave é certificação: garantir que a energia fornecida é realmente limpa e renovável. A CCEE está trabalhando nessa questão, criando uma plataforma que permitirá a negociação de certificados de energia renovável (I-RECs), além de hidrogênio verde e outros produtos. Usando sua base de dados, pode evitar também duplicidade de certificação, impedindo o chamado “greenwashing”.

Essa é uma oportunidade única para nós. O Google se comprometeu a zerar suas emissões de carbono até 2030, mas está tendo dificuldade enorme em cumprir a promessa. Precisamos assumir a tarefa de consolidar nossa posição de maior fornecedor global de energia limpa certificada. Essa é uma das missões centrais da nossa geração.

READER

Já era – achar que inteligência artificial não irá beneficiar o Brasil economicamente

Já é – perceber que o Brasil poderá ser o maior fornecedor de energia renovável do planeta

Já vem – trabalhar para aproveitar essa oportunidade rapidamente, para IA e outras indústrias (aviação, siderurgia, fertilizantes etc.) (Folha)

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