Antecipasto eleva em até 5 arrobas por hectare o ganho de peso de bovinos na entressafra da soja

Cerca de um ano após a sua validação, o Sistema Antecipasto já apresenta resultados expressivos em propriedades rurais do bioma Cerrado, consolidando-se como um aprimoramento da Integração Lavoura-Pecuária (ILP). Desenvolvida pela Embrapa Agropecuária Oeste (MS), a tecnologia antecipa em até 60 dias a formação da pastagem no ciclo da soja, garante maior disponibilidade de forragem mesmo em condições de estiagem e solos de baixa fertilidade e proporciona ganhos de até 5 arrobas por hectare no peso bovino durante a entressafra. Em alguns casos, o sistema pode elevar em até 50% a produção de carne por hectare e já está em expansão em cinco estados brasileiros.

O sistema permite ao produtor semear o capim ainda durante o ciclo da soja, cerca de 20 dias após a semeadura da oleaginosa, sem comprometer seu desenvolvimento. A antecipação é estratégica: ao invés de esperar pela colheita da soja para iniciar a formação da pastagem, como ocorre no modelo tradicional, o capim já está se desenvolvendo durante o ciclo da planta, garantindo entrada precoce dos animais no pasto após a colheita.

Com isso, o Sistema Antecipasto tem contribuído para recuperar áreas de pastagens degradadas no bioma Cerrado. É uma tecnologia capaz de intensificar a pecuária e reduzir a idade média de abate de bovinos. Essa estratégia vem sendo apontada também como uma forma de reduzir a emissão de metano, que é um dos principais gases de efeito estufa, uma vez que os animais produzem a mesma quantidade de carne em menos tempo de vida.

Por aliar benefícios tecnológicos e sustentáveis, o Antecipasto é um dos ativos tecnológicos que faz parte da Jornada pelo Clima. Essa iniciativa da Embrapa reúne esforços da ciência, governo e parceiros para promover soluções em prol da agricultura de baixo carbono, inclusiva e resiliente, em preparação para a COP30 em Belém.

Resultados em campo

Na prática, essa tecnologia tem causado impacto em áreas comerciais. Segundo o engenheiro agrônomo Carlos Eduardo Barbosa (foto à direita), responsável técnico das Estância Rosa Branca, em Rio Brilhante, MS, e Estância Retiro do Sertão, em Nova Alvorada do Sul, MS, onde esse sistema é adotado há cinco anos, a área de pastejo aumentou de 100 para até 150 dias por ano, e a lotação média subiu para 2,5 a 3,0 unidades animal por hectare (U.A./ha).

“Com o Antecipasto, os animais ganham de 700 a 800 gramas de peso por dia, contra os 500 a 700 gramas registrados no modelo convencional. São de 3 a 5 arrobas líquidas durante a estação seca. Isso muda o patamar de desempenho na pecuária”, explica Barbosa.

Além de aumentar a produtividade, o Sistema Antecipasto tem demonstrado maior resistência às variações climáticas extremas, especialmente em períodos de seca severa. Barbosa conta que nas áreas das propriedades onde foi adotado, foi possível manter a disponibilidade de pasto e a lotação de bovinos, cenário bem diferente do observado em áreas manejadas com o sistema convencional, onde houve falhas significativas ou até ausência completa de forragem.

“Em dois dos últimos cinco anos, os pastos de inverno só se formaram nos talhões que utilizavam o Antecipasto. Nos demais, o sistema convencional simplesmente não respondeu à semeadura ou responderam de forma parcial e limitada em baixíssimas lotações”, relata.

“Mesmo em solos com apenas 15% a 20% de argila, conseguimos bons resultados. O que mostra que o sistema é versátil e pode ser adaptado a diferentes condições produtivas”, afirma o engenheiro agrônomo.

Os benefícios do modelo não se limitam à produção. Por promover maior ganho de peso em menos tempo, o Sistema Antecipasto reduz o período de permanência dos animais no pasto. Isso significa menor emissão de metano entérico, contribuindo de forma concreta para práticas mais sustentáveis na pecuária.

“O modelo não compete com o cultivo da soja nem com o milho safrinha, respeita o calendário agrícola e ainda pode ajudar o Brasil a cumprir as metas de redução de desmatamento e de emissão de gases de efeito estufa”, destaca Barbosa.

Pioneirismo e expansão nacional
O pesquisador Luís Armando Zago Machado (foto à esquerda), da Embrapa Agropecuária Oeste, que é um dos idealizadores da tecnologia, explica que o sistema foi desenvolvido para enfrentar um desafio comum nas regiões de plantio de soja: a falta de chuvas após a colheita, o que prejudica a implantação da pastagem no modelo tradicional. “Nós víamos muitos produtores perdendo a oportunidade de formar o pasto. Com o Antecipasto, eles ganham tempo, produtividade e segurança”, afirma.Os resultados obtidos experimentalmente na Embrapa foram levados para unidades de validação em áreas de produtor. Ao todo foram 22, ao longo de vários anos. O sistema foi validado na Estância Rosa Branca, em Rio Brilhante, e na Fazenda Estrela do Quiteroi, em Anaurilândia, ambas em MS, na safra 2019-20.A partir de então a área só cresceu, sendo que em 2024 foram plantados 320 hectares na Estância Rosa Branca e Retiro do Sertão, em Nova Alvorada do Sul, também em MS, onde há solos mais arenosos e menor disponibilidade hídrica. Hoje, o sistema já está sendo adotado com sucesso também em Mato Grosso, onde produtores em Alto Garças e Santo Antônio do Leste cultivam 700 hectares com a tecnologia. Na Bahia, em Luís Eduardo Magalhães, o Antecipasto substituiu com sucesso a braquiária. Em Roraima, produtores testam a técnica e aguardam máquinas específicas para ampliar a adoção.
Novos produtores apostam na tecnologiaO potencial do Sistema Antecipasto também chamou a atenção do produtor Edgar Shuiti Tutida, da Fazenda Guaçu, em Itaquiraí, MS. Com quase 50 anos de experiência na pecuária e usuário da Integração Lavoura-Pecuária (ILP) desde 2000, ele saltou de uma produção de 200 kg para 1.600 kg de carne por hectare/ano ao intensificar o uso da integração.Com o Antecipasto no radar, a partir da safra 2025/2026, Tutida espera ganhar mais 50 dias de pastejo e aumentar em cerca de 100 kg/ha/ano a produção de carne. “Essa antecipação pode nos levar a patamares ainda maiores de produtividade. E o melhor: com sustentabilidade, sem desmatamento e respeitando o ciclo agrícola da soja”, diz.Ele reforça que a ILP e o Antecipasto são caminhos viáveis também para pecuaristas que queiram ingressar na agricultura. “A integração é um passo fácil e é um divisor de águas. No nosso caso, a parceria com o agricultor foi essencial”, conta.

Clima, pesquisa e próximos lançamentos

Para acelerar a adoção do Sistema Antecipasto em outras regiões, a Embrapa está organizando um plano de transferência de tecnologia diretamente com produtores e técnicos da assistência rural. A estratégia inclui comitivas técnicas com ações de sensibilização em estados que apresentam alto potencial para implantação da tecnologia.

“Nós estamos preparando uma comitiva em Mato Grosso do Sul e em outros estados onde há perspectiva de crescimento do sistema. A ideia é realizar palestras de orientação e, na sequência, implantar áreas demonstrativas para que o produtor possa entender como a tecnologia funciona na prática”, explica Zago. Segundo ele, o objetivo é que os produtores e técnicos acompanhem o sistema desde a semeadura da soja até o desenvolvimento do capim, entendendo como as duas culturas evoluem juntas no campo.

“Hoje, com os dados acumulados, podemos dizer com segurança que o Antecipasto é uma tecnologia validada, que pode ganhar escala, transformar a pecuária no Brasil, sem comprometer a soja, e ainda melhorar as condições para essa cultura”, conclui Zago.

O que está em uso e o que vem por aíO pesquisador alerta que o Antecipasto ainda está sujeito a riscos climáticos extremos, mas, ainda assim, responde melhor do que outros sistemas. “Nos anos muito secos, como 2021 e 2024, o Antecipasto também sofreu, mas ainda assim entregou melhores resultados do que o plantio convencional”, observa.A cultivar mais utilizada hoje no Sistema Antecipasto é a BRS Tamani, forrageira que já está consolidada no mercado e apresenta bom desempenho em consórcio com a soja. Com sementes disponíveis em larga escala e custo relativamente acessível, o Tamani tem sido a principal escolha dos produtores nas áreas de adoção da tecnologia.Segundo Zago, outras cultivares também foram testadas com bons resultados, mas ainda enfrentam algumas limitações. É o caso do capim Aruana, que apresenta bom desempenho no consórcio além de ser mais tolerante ao frio, porém tem baixa oferta de sementes.Outra alternativa que vem ganhando espaço é o capim Massai, semelhante ao Tamani, mas com características de maior rusticidade. “Ele tolera melhor o estresse hídrico e solos de menor fertilidade, o que o torna interessante para áreas com restrições edafoclimáticas, principalmente em regiões mais quentes”, acrescenta o pesquisador.O capim Paiaguás também demonstrou potencial no sistema, embora ainda esteja em fase menos avançada de validação dentro do Antecipasto. Segundo Zago, resultados promissores estão sendo obtidos com outras cultivares de Panicum maximum de maior porte e que apresentam maior potencial de produção, porém, estão sendo feitos os ajustes necessários para que eles não comprometam o desenvolvimento da soja. Essas adequações estão sendo feitas com os híbridos que irão dar origem às novas cultivares. “A previsão é que teremos nos próximos anos cultivares com menor custo de implantação, mais produtivas e com características de porte e densidade de folhas, que contribuam com o aumento do desempenho dos animais”, acrescenta.O Antecipasto tem espaço garantido em regiões nas quais a agricultura está consolidada, sem competir com o milho safrinha. “É uma excelente opção para os talhões, onde a soja é colhida mais tarde com risco elevado para o milho”, afirma o pesquisador.Paralelamente, o governo brasileiro já mapeou as áreas com aptidão agrícola, havendo a possibilidade de dobrar a área de soja a partir da conversão de pastagem degradas, podendo chegar a 40 milhões de hectares. “Essas áreas encontram-se em ambientes com alguma restrição, sendo que a maioria não é apta para safrinha de grãos. Como a pecuária já é praticada nessas regiões, é natural que se estabeleçam sistemas integrados, e o Antecipasto será fundamental para a melhoria das condições de solo e aumento da renda dos produtores”, conclui Zago.

Related Posts

  • All Post
  • Agricultura
  • Clima
  • Cooperativismo
  • Economia
  • Energia
  • Evento
  • Fruta
  • Hortaliças
  • Meio Ambiente
  • Mercado
  • Notícias
  • Opinião
  • Pecuária
  • Piscicultura
  • Sem categoria
  • Tecnologia

Leave a Reply

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Edit Template

Quer receber notícias do nosso Diário do Agro?
INSCREVA-SE

You have been successfully Subscribed! Ops! Something went wrong, please try again.

© 2024 Tempo de Safra – Diário do Agro

Hospedado e Desenvolvido por R4 Data Center