Começou a contagem regressiva para a implementação das regras trazidas pela Reforma Tributária. A partir do ano que vem o produtor rural já terá que lidar com dois sistemas tributários paralelos – o atual e o que será introduzido de forma progressiva até 2032, principalmente para os que operam na pessoa física, que terão de se atentar às obrigações ditas “acessórias” que vão impactar diretamente aqueles que faturam acima de R$3,6 milhões por ano com a atividade.
“Com a padronização dos tributos e das obrigações acessórias pelo novo sistema, haverá um aumento exponencial da transparência fiscal, facilitando o cruzamento de dados pela Receita Federal. O produtor rural pessoa física, até então pouco fiscalizado, estará mais exposto ao controle pela Receita, e sujeito a um novo nível de compliance e exigência documental, o que requer, necessariamente, uma adaptação cultural e operacional com a adoção de sistemas de gestão fiscal e contábil mais sofisticados”, alerta Ieda Queiroz, advogada coordenadora do setor de agronegócios do CSA Advogados.
“Neste contexto de expansão de atividade, estruturar as operações via pessoa jurídica, com maior flexibilidade contábil, permite um planejamento fiscal mais robusto, além de ganhos em gestão, governança e sucessão, compensando os novos encargos decorrentes da profissionalização da atividade rural”, afirma Queiroz.
Hoje, o produtor rural pessoa física apura seus resultados com base no Livro Caixa do Produtor Rural, recolhe o Imposto de Renda (até 27,5%) e o FUNRURAL sobre a receita bruta ou folha de salários. Os efeitos da tributação sobre o consumo atualmente (em relação a PIS/COFINS e ICMS) sobre a pessoa física são bastante limitados. No ano que vem, entram como obrigações:
- Obrigatoriedade de apuração de IBS e CBS: deverá (i) calcular periodicamente (provavelmente mensalmente) o valor do IBS e da CBS devidos com base na sua receita bruta e nas deduções legais (como créditos tributários sobre insumos); (ii) escriturar digitalmente suas operações de compra e venda em sistemas integrados com a Receita Federal e os fiscos estaduais/municipais; (iii) emitir documentos fiscais eletrônicos e alimentar sistemas fiscais.
- Não cumulatividade plena: com direito a crédito amplo ao longo da cadeia, inclusive para insumos agropecuários, serviços e ativos imobiliários adquiridos, o que pode beneficiar produtores organizados como pessoa jurídica.
- Fim de regimes favorecidos e isenções específicas: a nova sistemática elimina regimes especiais e exigirá uma adaptação para todos os agentes econômicos.
- Alíquota padrão estimada em 28% a 30%, com isenção ou redução de 60% para itens da cesta básica e insumos agropecuários: a depender da classificação do produto, o impacto pode ser severo para produtores pessoa física não estruturados.
“Sendo assim, o grau de formalização e controle que passará a ser exigido do produtor que opera na pessoa física será equiparado ao de uma empresa rural, o que coloca a exploração da atividade rural por meio pessoa jurídica em vantagem, pois já opera em um ambiente regulado e mais adaptado a esse tipo de exigência, com processos e estruturas que permitem maior controle, previsibilidade e governança”, explica Queiroz.
Além de ser uma alternativa fiscal diante do cenário da Reforma Tributária, a estruturação via pessoa jurídica apresenta outras vantagens ao produtor como maior organização patrimonial, com separação da atividade rural do patrimônio do sócio, permitindo melhores ferramentas e previsibilidade quanto à sucessão, o que, de acordo com a advogada, “se consolida cada vez mais como instrumento de perpetuação da atividade rural familiar, promovendo continuidade, proteção do patrimônio e governança intergeracional”.