O volume de amêndoas recebidas pelas indústrias foi 37,7% inferior ao mesmo período de 2023 e praticamente igual ao de 2024, indicando um segundo ano consecutivo de baixa oferta. A moagem acompanhou essa tendência e atingiu o menor volume para um primeiro semestre em nove anos. Apesar de uma leve melhora no segundo trimestre de 2025 em comparação com os primeiros três meses do ano, os dados consolidados do primeiro semestre mostram que a produção de cacau no Brasil permanece estagnada. Segundo levantamento do SindiDados – Campos Consultores, divulgado pela Associação Nacional das Indústrias Processadoras de Cacau (AIPC), o volume de amêndoas recebidas pela indústria foi de 58.188 toneladas nos primeiros seis meses do ano, recuo de 0,3% em relação ao mesmo período de 2024, quando foram registradas 58.363 toneladas. Contudo, na comparação com 2023, quando o recebimento somou 93.314 toneladas, o resultado representa uma queda de 37,7%. O setor já havia registrado forte retração em 2024 ante 2023. O impacto dos extremos climáticos, as perdas para doenças como a Vassoura de Bruxa e a Podridão Parda, e a falta de mão de obra nas lavouras brasileiras são os principais fatores para a dificuldade de recuperação da produção cacaueira. “Mesmo com os preços internacionais em alta, a produção nacional não tem respondido como esperado neste ano. O desempenho de 2025 confirma que ainda estamos longe de uma recuperação consistente. De todo modo, ainda acreditamos que o Brasil pode ser um dos grandes produtores mundiais de cacau, mas precisa superar essas dificuldades estruturais com investimento em inovação, tecnologia com foco na melhoria da produtividade e de clones resistentes”, analisa a presidente-executiva da AIPC, Anna Paula Losi. A baixa oferta interna impactou a indústria processadora. A moagem no primeiro semestre de 2025 foi de 97.904 toneladas, uma queda de 14,4% em relação a 2024, quando o volume foi de 114.377 toneladas, e de 22,6% na comparação com 2023. Trata-se do pior desempenho dos últimos nove anos. “A retração na moagem não se dá apenas pela escassez de amêndoas. O alto custo da matéria-prima e o impacto nos preços dos derivados também têm limitado a demanda. O setor está sendo pressionado por todos os lados”, avalia Anna Paula. O quadro abaixo demonstra que a defasagem entre a produção nacional e a demanda da indústria permanece elevada. Em 2025, o déficit foi de 39.716 toneladas — o que representa 40,6% de toda a moagem no semestre. Embora menor que o pico de 2024 (48,9%), o desequilíbrio segue estruturalmente alto e bem acima do registrado em 2023 (26,2%). “Em 2025, o déficit só não foi maior por conta da retração na moagem, impactada pelo baixo recebimento e pela redução da demanda”, acrescenta Anna Paula. |
Recebimento por estado A Bahia respondeu por 63,4% do volume total recebido no primeiro semestre de 2025, com 36.876 toneladas. O estado registrou uma queda de 27,7% em relação ao mesmo período de 2024, reflexo de perdas causadas por clima adverso e doenças fúngicas que afetaram as principais áreas produtoras. O Pará foi responsável por 26,9% do total nacional, com 15.658 toneladas. O volume representa um recuo expressivo de 59,9% no comparativo com o primeiro semestre de 2024. As fortes chuvas no início do ano e a redução da produtividade por hectare continuam limitando a recuperação do estado. O Espírito Santo contribuiu com 4.725 toneladas, o equivalente a 8,1% do total nacional. O estado registrou recuo de 19,9% em relação ao mesmo período do ano passado, mantendo a tendência de oscilação observada nas últimas safras. Rondônia respondeu por 918 toneladas, ou 1,6% do total nacional no primeiro semestre de 2025. O estado apresentou recuo de 30,2% em relação às 1.316 toneladas registradas no mesmo período de 2024. Importações e Exportações Diante do desabastecimento interno que marcou 2024 e persiste em 2025, as importações voltaram a crescer neste ano. No primeiro semestre de 2025, para atender o mercado externo, especialmente da América do Sul, que depende dos derivados produzidos no Brasil, foram importadas 42.143 toneladas de amêndoas, um aumento de 87,1% em relação às 22.523 toneladas registradas em 2024. “Se não houver recuperação na produção brasileira no segundo semestre, continuaremos observando um aumento da importação”, afirma Anna Paula. As importações de derivados também cresceram, chegando a 25.382 toneladas, alta de 20,4% em relação às 21.073 toneladas de 2024. As exportações de derivados também avançaram 27%, com 28.764 toneladas ante as 22.646 toneladas do ano anterior. Já a exportação de amêndoas caiu 19,6%, de 97 para 78 toneladas. “A cadeia do cacau no Brasil vive um momento crítico. Mesmo com os preços internacionais em patamares recordes, a produção nacional não dá sinais de recuperação, fazendo com que o País continue dependente das importações para manter o abastecimento”, diz a executiva. As exportações brasileira* de derivados de cacau somaram US$ 319 milhões no primeiro semestre de 2025, um crescimento expressivo de 71% em relação ao mesmo período de 2024, quando o total foi de US$ 186,5 milhões. O desempenho positivo é resultado, em parte, da manutenção da demanda externa, especialmente de países vizinhos da América do Sul, e da valorização histórica dos preços internacionais do cacau, que continuam em patamares recordes. Em termos de volume, o Brasil exportou 28,8 mil toneladas de derivados no primeiro semestre de 2025, alta de 25,2% em relação às 23 mil toneladas registradas no mesmo período do ano anterior. O crescimento mais acentuado em valor do que em volume evidencia a relevância do componente preço: mesmo com o aumento da quantidade exportada, foi a alta dos preços internacionais que impulsionou a receita em dólares. Esse descompasso entre valor e volume revela o peso da valorização da commodity nas exportações brasileiras, o que contribuiu para amenizar os efeitos da estagnação da produção interna sobre o desempenho externo da indústria. A Argentina se manteve como principal destino das exportações brasileiras, com US$ 83 milhões no semestre, seguida por Estados Unidos (US$ 35 milhões), Chile (US$ 10,4 milhões) e Países Baixos (US$ 10,3 milhões). Esses números confirmam o papel estratégico do Brasil como fornecedor regional de derivados de cacau, mesmo em um cenário de déficit de matéria-prima e queda da moagem interna. Para Anna Paula, a recuperação da produção nacional, o apoio ao produtor, a segurança jurídica e a modernização da lavoura são pontos centrais para restabelecer a autossuficiência e fortalecer o Brasil como player global. “Estamos enfrentando um déficit estrutural e consistente, que compromete não só a indústria, como a imagem do País no mercado internacional. Acreditamos no potencial brasileiro, mas os esforços de todos precisam mostrar resultados positivos a curto e médio prazo, para darmos uma guinada na cacauicultura brasileira”, pondera. Os números do primeiro semestre de 2025 reforçam a preocupação com a estagnação da produção brasileira, mesmo diante de preços internacionais em alta e de um cenário favorável para investimentos na cadeia produtiva. No entanto, a AIPC segue confiante no potencial da cacauicultura nacional e acredita que, com medidas articuladas entre setor público e privado, é possível reverter esse quadro. Há uma oportunidade real de transformação – desde que a agenda de fortalecimento da produção continue sendo priorizada. Análise de mercado internacional Ao longo da primeira metade de 2025, os preços futuros do cacau seguiram em níveis historicamente elevados, sustentando o patamar atingido desde a disparada das cotações no início de 2024. Isso é o que aponta a análise de mercado da consultoria Stonex. Nesse período, sobretudo, os preços refletiram a expectativa para a oferta na temporada 2024/25, cuja recuperação inicialmente promissora perdeu força rapidamente no Oeste Africano. “A frustração com o ritmo da colheita nesses países, responsáveis por cerca de 70% da oferta global, tem reforçado os temores de uma recuperação mais lenta da produção”, avalia Lucca Bezzon, analista da StoneX. Em contrapartida, países produtores, historicamente menores, como Equador e Indonésia, vêm apresentando crescimento relevante, com dados de exportação indicando avanços consistentes. Além disso, a demanda global mostra sinais de arrefecimento, pressionada pelos preços elevados, o que ajuda a mitigar o desequilíbrio entre oferta e demanda e reduz a probabilidade de um novo déficit ao fim da temporada. “Por isso, por ora, a StoneX projeta um leve superávit global para 2024/25, de outubro a novembro”, explica o analista da StoneX, Rafael Borges. Com o encerramento da safra, em setembro, o foco se volta à temporada 2025/26, cujas entregas devem se intensificar a partir de outubro. O desenvolvimento das lavouras, iniciado em abril, ocorre sob chuvas próximas à normalidade nas principais regiões produtoras, favorecendo uma perspectiva moderadamente otimista. De acordo com a Stonex, caso esse padrão climático se mantenha, a combinação entre boas chuvas, preços elevados e maior margem para investimentos pode impulsionar um desempenho mais sólido na próxima safra. Tal contexto, por sua vez, tem contribuído para uma moderação na percepção de risco de oferta nos contratos de vencimento mais longo, embora o cenário ainda dependa de novas informações, especialmente climáticas. Por fim, a demanda global segue como variável importante. Apesar da desaceleração nos dados de processamento desde o início de 2024, alguns números ainda seguem superando expectativas, o que mantém dúvidas sobre a intensidade do processo atual de destruição da demanda. Além disso, o comportamento dos dados de consumo ganha complexidade adicional diante da imposição de tarifas de importação por parte dos Estados Unidos, um dos principais destinos do cacau e seus derivados. Tais medidas, ao encarecerem os produtos importados, podem exercer pressão adicional sobre a demanda norte-americana, impactando negativamente os dados globais de processamento. |

8 de julho de 2025/
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Perdas ainda estão sendo avaliadas, mas variam bastante de uma região para outra conforme a intensidade...