Por Adriano Pires
Estudo do Fórum de Segurança Pública revela que lucro com a venda ilegal e o contrabando de combustíveis e bebidas já é maior do que o com o tráfico de cocaína.
O setor de combustíveis é um dos mais pujantes da economia brasileira e um dos pilares da arrecadação de impostos no País. Segundo a Receita Federal, o Tesouro brasileiro arrecadou no ano passado pouco mais de R$ 2,7 trilhões em impostos. Desse montante, o setor de combustíveis foi responsável pelo recolhimento de R$ 105,354 bilhões, ou 3,9% do montante total.
Como vários setores da economia, o segmento de combustíveis envolve uma gama diversa de atores. Entre eles, há empresas que cumprem à risca suas obrigações tributárias, investem em tecnologia, marketing a serviço da revenda e redobram os cuidados com inúmeros testes para aferir a qualidade dos seus produtos, entre outras medidas.
Por outro lado, há empresas que usam de diferentes expedientes para fraudar a composição de produtos e sonegar impostos – seja por via de liminares ou por ter nas fraudes tributárias um modelo de negócio por si só – visando a escalar patrimonialmente e expandir seus tentáculos no mercado legal.
Um estudo do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP) revela que o crime organizado no Brasil está lucrando mais com a venda ilegal e o contrabando de combustíveis e bebidas do que com o tráfico de cocaína.
Segundo o levantamento, os grupos criminosos acumularam R$ 146 bilhões anuais a partir de 2022 com movimentos criminosos envolvendo combustíveis, bebidas, cigarro e ouro, enquanto a receita com drogas foi de apenas R$ 15 bilhões.
Quando a lupa é direcionada especificamente ao setor de combustíveis, o FBSP revela que a receita dos criminosos foi de R$ 61,5 bilhões, o que representa 41,8% do montante acumulado a partir das práticas realizadas pelas facções. Segundo a entidade, são 13 bilhões de litros comercializados ilegalmente todos os anos, com perdas fiscais de R$ 23 bilhões. O cenário apresentado aqui mostra a necessidade de medidas urgentes para sanear o mercado de combustíveis.
No Legislativo, o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), chancelou a abertura de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar o crime organizado. O senador Alessandro Vieira (MDB-SE) propôs a investigação e a comissão poderá ser instalada após o carnaval.
Se o cerco investigatório parece estar evoluindo de forma a emprestar mais visibilidade ao grave problema, ainda resta na mão do Poder Legislativo uma alternativa que pode contribuir para blindar quem atua com responsabilidade no mercado de combustíveis: a criação da figura jurídica do devedor contumaz.
Cumpre um esclarecimento: o devedor contumaz não é aquele contribuinte que compra um carro ou imóvel e deixa de pagar as mensalidades por insuficiência de renda. O devedor contumaz é o empresário que, deliberadamente, não recolhe impostos e se mantém no mercado crescendo patrimonialmente e ganhando market share à custa dos atores regulares que cumprem suas obrigações tributárias (Adriano Pires é diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE); Estadão)