Adiar o planejamento sucessório ficará cada vez mais oneroso e burocrático aos produtores rurais

Regulamentação do Imposto Sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD) pode gerar maior taxação com a reforma tributária na divisão de heranças e patrimônio no campo

O planejamento sucessório consiste na organização prévia da sucessão dos bens, por meio de estratégias jurídicas destinadas à administração eficiente do patrimônio. No contexto do produtor rural, isso envolve essencialmente as propriedades no campo, mas também maquinário, semoventes (animais de criação), estoques de grãos, capital de giro e demais ativos vinculados à atividade agrícola ou pecuária.

De acordo com o advogado tributarista e agrarista Álvaro Santos, especialista em planejamento patrimonial e sucessório no agronegócio, a ausência de qualquer organização nesse sentido faz com que, em caso de falecimento do produtor, todo o patrimônio seja automaticamente submetido ao procedimento de inventário, conforme determina a legislação civil. “O inventário implica custos significativos, entre eles o ITCMD (Imposto Sobre Transmissão Causa Mortis e Doação), tributo de competência dos Estados e do Distrito Federal, cujas alíquotas podem chegar a 8%”, destaca o especialista.

Cada unidade federativa define suas próprias alíquotas de ITCMD para heranças e doações, respeitando o teto fixado pelo Senado Federal. Em Goiás, por exemplo, bens acima de R$ 600 mil são tributados à alíquota máxima de 8%. Já em São Paulo, o percentual atual é de 4%. Entretanto, desde 2019 tramita no Senado um projeto de resolução que amplia o teto nacional do ITCMD de 8% para 16%, o que representa um movimento de elevação da carga tributária incidente sobre patrimônio e transmissão de bens. “Vale ressaltar que o ITCMD ocorre tanto em transmissões causa mortis quanto nas doações realizadas em vida, inclusive na antecipação sucessória”, diz Santos.

Mudanças trazidas pela Reforma Tributária

A reforma tributária trouxe mudanças relevantes relacionadas ao ITCMD. Embora sua principal finalidade seja substituir os atuais tributos sobre consumo (ICMS, ISS, PIS, Cofins e IPI) criando novos: Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) e Imposto Seletivo (IS). Como os estados estão perdendo a arrecadação e autonomia na reforma tributária, eles exigiram que fossem feitas alterações no ITCMD e isso impacta os planejamentos patrimoniais e inventários.

Principais alterações já aprovadas:

  1. Obrigatoriedade de alíquotas progressivas: A Emenda Constitucional nº 132/2023 passou a exigir que os Estados instituam alíquotas progressivas de ITCMD, de modo que quanto maior o patrimônio transmitido, maior será a alíquota. Antes, essa progressividade era facultativa.
  2. Competência tributária baseada no último domicílio do falecido: Antes da reforma, no caso de inventário envolvendo cotas, era possível escolher o local do inventário, influenciando diretamente o ITCMD devido. Com a alteração constitucional, a competência passou a ser obrigatoriamente do último domicílio do falecido.
  3. Possibilidade de cobrança do ITCMD sobre bens no exterior: A reforma autorizou os Estados a cobrarem ITCMD sobre doações e heranças de bens no exterior mesmo antes da edição da lei complementar regulamentadora. Normas estaduais anteriores foram consideradas inconstitucionais pelo STF, por falta de lei complementar, mas a EC nº 132 supriu essa lacuna.

Agir de forma estratégica é essencial

Há uma tendência clara de aumento da carga tributária sobre sucessão e sobre reorganizações patrimoniais. Por isso, a recomendação é não adiar o planejamento patrimonial. Estratégias como doação com reserva de usufruto e a constituição de holdings rurais continuam válidas, mas exigem cada vez mais precisão técnica e análise individualizada.

A constituição de uma holding patrimonial, por exemplo, permite que os proprietários concentrem seus bens em uma estrutura societária, viabilizando a transferência das cotas aos herdeiros em vida. Esse modelo pode, em muitos casos, evitar a abertura de inventário. Entretanto, a transferência de cotas pode se dar por doação e, portanto, também estará sujeita ao ITCMD. “Em alguns estados, a doação de cotas é mais vantajosa do que a doação direta da própria fazenda”, explica Santos.  Em São Paulo, por exemplo, a avaliação das cotas costuma ser economicamente mais favorável que a avaliação de imóveis rurais, o que torna essa estratégia especialmente atrativa.

Ainda segundo o especialista, a recomendação é que a classe produtora tome atitude rápido, pois está em tramitação o PLP nº 108/2024, em fase final de discussão, que deve estabelecer normas gerais sobre o ITCMD e instituir o comitê gestor do IBS e da CBS. “O texto atual prevê uma metodologia padronizada para avaliação de cotas de holdings, considerando o valor dos ativos ajustados ao preço de mercado, o que pode elevar significativamente o custo das doações em holdings rurais independentemente do Estado em que sejam constituídas, caso essa seja a estratégia adotada”, antecipa.

Ajuda profissional

Conforme analisa o advogado, há uma tendência que nos próximos anos o processo de sucessão e doação de bens fiquem mais onerosos. Por isso, a principal orientação é buscar um planejamento o quanto antes e não adiar. “O que se desenha para o futuro é um aumento e uma complexidade tributária. Por isso, o produtor precisa se antecipar”, reforçou o especialista.

Ainda segundo Santos, mesmo com um bom planejamento, não se consegue evitar todos os riscos, porém com a ajuda profissional experiente e capacitada são analisados os prós e contras de cada ferramenta de planejamento dentro do perfil de cada família. “ O primeiro conselho é que saiam da inércia, pois esperar pode custar caro”, finalizou o especialista. 

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