Chefes de Estado e de governo globais passaram por Belém com histórias inusitadas, reclamações e pressão para que tudo ficasse pronto, encontros — e desencontros — nos restaurantes mais famosos da cidade e compartilhamento de hotéis de luxo.
O Estadão flagrou alguns desses momentos, da preparação e conta agora histórias de bastidores da cúpula de líderes da COP-30:
Hospedagem compartilhada
Saiba o que pouca gente viu da passagem de líderes globais por Belém, capital amazônica que recebe a maior conferência do clima do planeta.
A conhecida crise de hospedagem que fez o governo Lula criar e antecipar a cúpula, levou o presidente de Portugal, Marcelo Rebelo de Sousa, a telefonar para o empresário Jorge Rebelo de Almeida, da rede Vila Galé. Ele pediu que o empresário desse um jeito de acelerar as obras e entregasse o hotel na zona portuária a tempo. Do contrário, os portugueses não teriam onde se hospedar. Deu certo – apesar de nem tudo estar pronto ainda no hotel da rede.
Ao fim, a delegação portuguesa, liderada incialmente pelo primeiro-ministro Luís Montenegro, dividiu o hotel com a delegação da União Europeia – formada pelo também português António Costa (presidente do Conselho Europeu) e pela alemã Ursula von der Leyen (presidente da Comissão Europeia).
Outro ponto dividido foi o novo Tivoli Maiorana, onde ficou a delegação britânica – príncipe William e premiê Keir Starmer, e artistas como a cantora Fafá de Belém.
A divisão de hotéis de luxo não é incomum, mas algumas delegações, como a Chinesa e a dos Estados Unidos, não costumam aceitar. Nem pensar em dividir o quarto – o que sobrou para negociadores, funcionários dos governos, ambientalistas e jornalistas.
O red carpet do ditador
Mas foi outro hóspede quem roubou a cena no Vila Galé Collection Amazônia. Lá também ficou alojada a comitiva presidencial da República do Congo.
O governo de Brazzaville estendeu um tapete vermelho no hall de entrada e nos corredores de acesso à suíte ocupada pelo ditador Denis Sassou N’Guesso, ex-oficial militar que comanda o país africano desde 1997.
O tapete foi estendido no chão para que o congolês entrasse e saísse do quarto, cujo ambiente também foi modificado para atender suas exigências. Veja a foto abaixo obtida pela reportagem:
Mesmo na divulgação oficial do país é possível ver o red carpet, na entrada da suíte.
Nem todos tiveram a exigência, mas no exterior o tapete também é colocado, por exemplo, para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Foi assim na Malásia, na recepção do hotel Renaissance de Kuala Lumpur.
Queixa do Talibã ausente e novo líder sírio presente
A cúpula também permitiu a primeira breve interação entre o presidente Lula e Ahmad Al-Sharaa, novo líder do governo da Síria, que assumiu após a queda do regime de Bashar Al-Assad, derrubado por seu grupo, o Hayat Tahrir al-Sham (HTS). O petista o cumprimentou na recepção aos líderes.
O governo talibã, por sua vez, reclamou de o Afeganistão não ter sido formalmente convidado para participar da conferência. A exclusão motivou nota pública de protesto, publicada pela Agência Nacional de Proteção Ambiental afegão, a Nepa. Em nome do governo, o órgão disse que o Afeganistão é um dos países mais vulneráveis a mudanças climáticas.
O Talibã reclama de falta de reconhecimento internacional, sobretudo no Ocidente, algo que o sírio tem conseguido, depois de um passado jihadista ligado à Al Qaeda. Ele vai se encontrar com Donald Trump e saiu da lista de terroristas dos EUA.
Ilha, jardim botânico ou museu: tudo pela imagem
Como a imagem diz muito na política, os chefes de Estado e de governo aproveitaram a passagem para garantir registros que mostrassem o ambiente de uma floresta tropical – embora a maioria não tenha sequer saído da área urbana de Belém.
Quem teve mais tempo, optou por uma experiência imersiva na Ilha do Combu, que requer uma travessia curta de lancha e permite, em algumas horas, de banho de rio à prova de chocolates orgânicos, como fez o presidente do Conselho Europeu, o português António Costa.
Já a colega dele Ursula von der Leyen aproveitou para circular no Bosque Rodrigues Alves, onde conheceu exemplares da fauna e da flora local, segurou um papagaio, observou quelônios e pegou no colo e afagou um quati.
O príncipe de Gales, William, herdeiro do trono britânico, circulou pelo Museu Paraense Emílio Goeldi, onde pode ouvir aves da coleção e ver as cotias soltas, um passeio interrompido pela chuva amazônica.
Rivais em restaurante premiado
Um dia depois de a reunião de líderes acabar, as delegações e autoridades foram aproveitar uma vez mais a premiada culinária paraense. Alguns dos restaurantes mais concorridos foram o Santa Chicória, a Casa do Saulo das Onze Janelas, o Celeste e o descontraído Puba.
Antes de decolar para Porto Alegre, a ex-presidente Dilma Rousseff apareceu no sábado, dia 8, para um almoço com seus assessores diretos na Casa do Saulo. O chef Saulo Jennings foi até a mesa cumprimentá-la.
Dilma vive hoje em Xangai, na China, e preside o Novo Banco de Desenvolvimento (NDB), instituição financeira do Brics, tendo muita proximidade com o governo comunista de Xi Jinping.
A ex-presidente entrou de óculos escuros e blazer vermelho no salão principal climatizado e passou sem perceber ao lado da mesa ocupada por ativistas de ONGs e o embaixador Benito Liao, representante no Brasil do governo de Taiwan – ilha que desafia Xi e busca manter sua autonomia de Pequim.
Lá ocorreria outro “desencontro”. No mesmo restaurante, na mesma hora, almoçou em mesa separada por uma parede a ministra Marina Silva (Meio Ambiente), com a equipe do ministério. Marina optou por uma mesa ao ar livre, do lado de fora e voltada para a Baía do Guajará.
Marina e Dilma protagonizaram divergências quando foram ministras do governo Lula, por causa dos impactos da construção e licenciamento de usinas hidrelétricas de Santo Antônio, Jirau e Belo Monte. Marina acabou saindo do governo, e Dilma foi promovida a substituta de Lula e se elegeu presidente.
Na disputa da reeleição, Marina concorreu a presidente depois da morte de Eduardo Campos (PSB), numa queda de avião, e virou alvo de uma campanha de desinformação liderada pelo marqueteiro petista, contratado por Dilma, João Santana. A ministra sempre se queixou dos ataques.
A reportagem do Estadão conversou com ele e perguntou se Guterres continuava pessimista ou se os resultados da reunião de líderes o fizeram mudar previsão sobre o futuro do planeta. O português não quis comentar, mas disse que aprovou seu prato. E, sobretudo, a sobremesa.
Guterres comeu uma costela de “Brangus” assada por 24 horas, servida com arroz moreno de cebola e tomate cocasse, cebola na brasa e farofa de Bragança.
De sobremesa o secretário-geral da ONU preferiu algo à base de chocolate. Ele comeu um bolo “flerte”, assim descrito no cardápio: “irresistível bolo de chocolate cremoso com calda de chocolate, bola de sorvete de chocolate belga e calda quente. Ideal para quem quer garantir a conquista com um único pedido” (Estadão)





