O Banco do Brasil construiu uma narrativa fantasiosa e a imprensa comprou

Por Octaviano Neto

O agro não teve crise. Não tem crise. E não terá crise. O agro é o setor mais resiliente da economia brasileira.

Tenho visto o Banco do Brasil insistir na narrativa de uma crise no agronegócio para justificar a queda no seu lucro líquido e consequentemente em seu ROE.

Mas os dados contam outra história:

1) Mesmo dentro do próprio BB, a inadimplência do agro é menor do que a de pessoa física e pessoa jurídica.

2) A carteira de crédito de bancos privados como Itaú e Bradesco também confirma a solidez do setor.

3) Recente relatório da FEBRABAN crava: “no mercado brasileiro, as operações de crédito rural com recursos obrigatórios (taxas reguladas) pata pessoas físicas teve uma inadimplência de 1,46% em abril/2025. Nos Estados Unidos, os atrasos acima de 90 dias foi de 1,18% (1T25).”

O que está em jogo não é a realidade do campo, mas sim uma construção de narrativa para desviar a atenção de problemas dentro do Banco do Brasil. Me surpreende que parte da imprensa adote essa versão sem o devido contraponto. O resultado é uma percepção distorcida, que tenta colocar no agro uma culpa que não existe.

Hoje, o Valor Econômico, traz meia página e um título tratando da “disparada na inadimplência”, mesmo com os presidentes do Itaú Unibanco e do Bradesco, afirmando, em aspas, o contrário:

Milton Maluhy Filho, CEO do Itaú Unibanco: “essa não é a realidade do Itaú, que tem uma carteira muito equilibrada”.

Marcelo Noronha, CEO do Bradesco, afirmando que a inadimplência está controlada: “O agro do Brasil é o mais competitivo do mundo., o mais produtivo em todas as culturas.

O agro brasileiro segue sólido. Assim como a torcida para que o agro vá mal também segue firme. Mas venceremos. Como sempre! (Octaciano Neto, ex-secretário da Agricultura do Espírito Santo é consultor financeiro; Linkedin)


Inadimplência dispara no agro e preocupa bancos 

Setor enfrenta várias dificuldades, com onda de recuperações judiciais e nova regra contábil.

O setor bancário tem sofrido com um forte aumento da inadimplência no agronegócio nos últimos meses. Mesmo sem problemas de safra – as projeções mais recentes indicam produção recorde de milho e alta expressiva na colheita de soja em 2025 – uma série de dificuldades têm contribuído para este cenário.

O momento mais agudo começou com uma queda nos preços das commodities, que pressionou as margens dos produtores, já muito alavancados, após tomarem crédito com a Selic nas mínimas históricas em 2020 e 2021. Mas o segmento também enfrenta uma onda de recuperações judiciais (RJs) e os efeitos do impacto da resolução 4.966 do Banco Central (BC), que alterou regras de provisionamento e implementou o conceito de “perda esperada”. Agora, o tarifaço do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, contra o Brasil, pode tornar o cenário ainda mais nebuloso.

Com participação de mercado de quase 50% no agro, o Banco do Brasil é a instituição financeira que mais tem sentido os problemas do setor. A inadimplência disparou, atingindo o recorde de 3,94%, ante 2,45% de um ano antes e 0,96% no fim de 2023. A carteira soma R$ 404,9 bilhões e o BB diz que cerca de 20 mil clientes estão inadimplentes, sendo que 74% deles nunca tinham dado calote no banco até 2023. Segundo a instituição, 52% da inadimplência está concentrada no Centro-Oeste e Sul e 50% nas culturas de soja, milho e bovinos.

Além disso, são 808 clientes em RJ, que somam uma carteira de R$ 5,4 bilhões. Em 2020, o Supremo Tribunal Federal (STF) entendeu que grandes produtores rurais equivalem a empresas e, assim, podem pedir recuperação judicial (RJ) na pessoa física. Em 2023, o BB começou a ver um salto nesses pedidos, no que classifica como “litigância predatória”. A presidente do BB, Tarciana Medeiros, diz que escritórios de advocacia têm campanhas para atrair clientes para RJ, focadas no BB, e que está avaliando a possibilidade de entrar na Justiça contra eles. “Recuperação judicial é para quem precisa, vamos combater litigância abusiva”.

Crédito rural

Segundo o Banco Central (BC), o crédito rural com recursos direcionados para pessoa física somava R$ 539,8 bilhões em junho, com expansão anual de 7,5%. Já na pessoa jurídica eram mais R$ 99,3 bilhões, com alta de 9,4%. Na pessoa física, a inadimplência disparou de 1,5% para 3,5% em um ano.

Dados da Serasa Experian mostraram que os pedidos de RJ no agro atingiram 389 no primeiro trimestre, uma alta de 21,5% ante o quarto trimestre e de 44,6% na comparação com o início de 2024. “Muitos produtores enfrentam custos altos, prazos longos para receber, maior exigência de garantias e dificuldades na rolagem de dívidas, fatores que pressionam o caixa e reduzem as margens para manobras”, diz o diretor de agro da empresa, Marcelo Pimenta.

No Santander, que tem R$ 22,4 bilhões em linhas de crédito rural (os bancos normalmente somam empréstimos adicionais na “carteira agro”, como concessões de linhas diversas, mas destinadas a clientes do setor), o CEO, Mario Leão, afirmou que a inadimplência ainda vai ter alguns trimestres desafiadores. “Estamos possivelmente vivendo o momento mais duro do ciclo do agro, mas em algum momento isso vai voltar”, disse.

No Itaú, o CEO, Milton Maluhy Filho, admitiu que o agro tem sofrido mais nos últimos dois anos, após um ciclo de muita bonança. Ainda assim, ele ressaltou que essa é a realidade do mercado, mas não a do Itaú, que tem uma carteira muito equilibrada, incluindo em termos de diferentes culturas. Segundo ele, com uma carteira de mais de R$ 130 bilhões no agro, o Itaú teve um share bem menor, proporcionalmente, nos pedidos de RJ entre as empresas do setor, de apenas 5%. “Isso é consequência de uma gestão de portfólio muito ativa, feita de forma cuidadosa, com boas garantias”.

No Bradesco, o CEO, Marcelo Noronha, foi na mesma linha, afirmando que a inadimplência está controlada. “O agro do Brasil é o mais competitivo do mundo, o mais produtivo em todas as culturas. É claro que, se tem uma cultura ou outra que tenha dificuldade maior, a gente tem de captar isso nos nossos modelos, avaliando o segmento, geografia, por cliente. Não entramos em culturas que tenham problemas e muitas das linhas têm garantia”. As linhas específicas de crédito rural do banco somam R$ 79,4 bilhões.

Cooperativas

Entre as cooperativas, o Sicredi diz que tem observado um aumento da inadimplência, com intensidade distinta entre regiões, refletindo realidades climáticas e de perfis diferentes de produtores. “O momento exige atenção e gestão ativa”, diz, em resposta a questionamentos do Valor. O sistema cooperativo também aponta para uma elevação nos casos de RJ. “Acompanhamos com atenção o crescimento de RJ no agro, especialmente em regiões com dificuldades climáticas e econômicas. É importante distinguir os casos legítimos daqueles em que há uso estratégico do instrumento, o que pode prejudicar a cadeia produtiva e a disponibilidade de crédito”.

No mês passado, o governo informou que o Plano Safra 25/26 será de R$ 594,4 bilhões, dos quais R$ 516,2 bilhões para os médios e grandes produtores e R$ 78,8 bilhões para a agricultura familiar. Serão pouco menos de R$ 10 bilhões a mais, ou 1,69% acima dos R$ 584,5 bilhões da safra anterior, com correção abaixo dos 5,32% da inflação do período.

Como o Valor mostrou na ocasião, analistas apontaram que juros altos e menos subsídios para a agricultura empresarial resultam em incerteza e endividamento. Para o diretor de agro do Santander, Carlos Aguiar, a situação fiscal afeta a política de equalização justamente em um contexto de mercado endividado. “E o governo não anunciou nada em relação a isso, exceto a criação de um grupo de trabalho. Vai ser um ano difícil”.

Como o Plano Safra 24/25 atrasou, muitas operações do fim do período ainda vão vencer entre julho e setembro, o que significa que a inadimplência deve continuar pressionada no terceiro trimestre. Enquanto isso, o BB tem adotado uma série de ações para tentar conter a situação, como trocar as garantias usadas (de penhor e hipoteca para alienação fiduciária, que é mais célere de executar e muitas vezes não é incluída em uma RJ); melhorar a esteira de cobrança; e judicializar mais.

O vice-presidente financeiro do BB, Geovanne Tobias, lembrou que o banco era conhecido por não executar garantias, que gostava de tomar um cafezinho com o cliente e evitar estresse na relação, mas que agora isso está mudando (Globo Rural)

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