Editorial Folha de S.Paulo
- Plano de Lula para socorrer empresas constitui nova violação das regras orçamentárias e pode ser aviltado por lobbies no Congresso
- Não há objetivo de modificar a política protecionista, que dificulta a reorientação de exportadores afetados pela guerra comercial
As providências anunciadas pela administração petista a fim de atenuar os efeitos do tarifaço de Donald Trump parecem comedidas e devem auxiliar algumas empresas na transição de seus negócios. Mais uma vez, no entanto, desprezam as regras orçamentárias —e ainda podem ser objeto de lobbies daninhos no Congresso Nacional.
Em última análise, cabe acrescentar, mesmo o futuro mais próximo das empresas exportadoras, em particular das que têm os Estados Unidos como destino de seus produtos, dependerá de mudanças na política comercial.
De mais importante, o plano do governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT), batizado politicamente como “Brasil Soberano”, prevê linha de crédito de R$ 30 bilhões e benefícios fiscais para empresas que vendem para os EUA, em montante limitado a R$ 5 bilhões.
Fundos de garantias de crédito receberão novos recursos, no total de R$ 4,5 bilhões, o que constitui despesa primária, ou seja, não financeira —que, portanto, deveria estar enquadrada nos limites das normas fiscais.
Ainda que o valor não seja expressivo para as dimensões do Orçamento, trata-se de mais uma exceção aberta no chamado arcabouço, assim como gastos com precatórios, emergências climáticas e devolução de valores cobrados de modo fraudulento de beneficiários do INSS. Desse modo, o plano para o controle da dívida pública perde mais credibilidade.
Os empréstimos virão do Fundo de Garantia de Exportação, que ora dispõe de mais de R$ 50 bilhões. Como, ao menos por ora, não haverá aporte novo do governo ao FGE, não haverá despesa aí.
O plano declarado é financiar em especial pequenas e médias empresas mais prejudicadas pela tarifa americana de 50%, embora o dinheiro possa ser emprestado a outros tomadores. Ainda não há definição de taxas de juros, inferiores às de mercado, prazos e critérios de seleção.
O benefício fiscal maior virá da ampliação do programa Reintegra, que em teoria devolve a exportadores impostos domésticos que foram pagos e, pois, incorporados ao custo dos produtos vendidos no exterior.
Na prática, o Reintegra funciona com subsídio genérico, calculado com base em uma porcentagem do valor exportado, a ser elevada. Prevê-se que o benefício se limite a firmas que vendem para os EUA. O risco é de que, no Congresso, a isenção seja concedida a qualquer exportador.
Será permitida ainda a postergação do pagamento de impostos e dívidas com o governo por dois meses. O prazo para ter direito à isenção tributária para insumos de exportação foi estendido.
Os problemas do “Brasil Soberano”, além do desrespeito às regras fiscais, são os costumeiros. Cria-se um sistema de empréstimos subsidiados, porta aberta para mais crédito direcionado. Não há planos de modificar uma política de cunho protecionista, que dificulta a inescapável reorientação de exportadores afetados pela guerra comercial (Folha)